29 de junho de 2017
Vivemos tempos difíceis, é verdade, mas temos também vitórias, precisamos comemorar e partilhar. Ontem à noite, 24/06, aconteceu a tão aguardada pelas nossas crianças Festa Junina da escola Infantil do Córrego Bley, interior de São Gabriel Gabriel da Palha, que fica no interior do Espírito Santo. Essa festa foi simbólica, linda e muito importante.
Em fevereiro de 2017 inicia o ano letivo no município menos na escola infantil do Bley, após várias provocações das famílias junto à prefeitura esta marca uma reunião na comunidade achamos que era para anunciar o início das aulas, mas era para nos dizer que a escola seria fechada e as crianças levadas para a cidade, que teria transporte e assim ficava mais barato. Enquanto famílias resistimos, não aceitamos e passamos duas semanas num impasse com a prefeitura, apresentando diariamente soluções para as justificativas que a prefeitura apontava para fechar a escola.
Começam as aulas, na escola o fogão quebrado, sem panelas suficientes, sem material de cozinha, a professora deveria cuidar da limpeza (sala de aula, pátio, banheiros, cozinha), cuidar da comida e do pedagógico com as crianças e a prefeitura não estava buscando todas as crianças (ainda permanecem três sem transporte). Sabíamos que por trás desta precariedade estava o desejo de nos vencer pelo cansaço e fechar mais uma escola no campo. Enquanto famílias então fomos resolvendo as situações. Ainda há bastante coisas para serem feitas, mas a escola funciona bem, e as crianças ficam ansiosas pelo próximo dia de ir à escola.
Quanto à festa, fui informado pelo meu filho, quase um mês atrás que teria a festa, e todos os dias ele falava desta, queria levar produtos da nossa roça, e queria uma roupa muito bonita, entendi o motivo ontem à noite quando a professora nos explicou que todo o trabalho pedagógico do último mês foi sobre a festa junina, o sentido real desta festa e ela também explicou as crianças porque muitos se fantasiam de “caipiras” com roupas remendadas, chapéu esgarçado, dentes podres… isso é uma forma de desvalorizar e humilhar as famílias camponesas por que elas não são assim, e se algumas vivem assim, só mostra como nossa sociedade está doente, porque quem produz o alimento e trabalha de sol a sol na roça falta a estes dignidade, e não é motivo de fazer piada, não é engraçado e não é motivo de festa.
Todo o dia de ontem, 24, foi de mutirão, todas as famílias contribuíram para ornamentar, preparar comida, fazer prendas para o sorteio enfim, um mutirão, o sentido real da relação família, escola e comunidade, todos reunidos começa a festa, a tia Gerlane dá boas vindas a todos e agradece ao Zeca, da coordenação da igreja local (que é onde funciona a escola) pelo apoio da comunidade para a escola funcionar, agradece ao Leo, um camponês, vizinho da escola, por fazer serviço de pedreiro, bombeiro, eletricista, mecânico, a Laiane que é ajudante que faz a comida, limpeza, e muito mais… e vai agradecendo aos membros do mutirão diário que é manter uma escola pública no campo contra a vontade do Estado.
No início da quadrilha, a professora conduz uma reflexão sobre o sentido de ser agricultor, de se fazer a festa, e nos deu a aula já dita acima, as crianças cada um com um produto da sua roça na mão, todas lindas e bem arrumadas, nenhuma abaixo do peso. A dança foi linda, simples, e carregada de muita alegria, víamos as crianças se divertindo e sendo crianças. Depois a janta coletiva, sorteios, e muitas conversas.
As vitórias comemoradas nesta festa são a manutenção da escola contra a vontade do Estado, as crianças todas lindas e bem alimentadas, bem arrumadas, orgulhosas de serem do campo, uma professora que mais do que ensinar alfabeto e números ensina às crianças o valor de ser camponês e camponesa, a comunidade reunida, a esperança e a certeza de dias melhores.
Espero que este registro não seja motivo para a prefeitura criar ainda mais problema e querer fechar nossa escola, desta vez argumentando que ela está dando certo e isso não pode acontecer, espero que a professora não seja perseguida por estar ideologizando ao dizer que não se deve usar roupas remendadas na festa junina, mas espero que a esperança do mundo melhor nos mova a fazê-lo. ra
Pela noite, os profundos agradecimentos à professora, às crianças, às famílias, à comunidade, aos que fazem o debate da educação do campo, à RACEFFAES, ao Movimento dos Pequenos Agricultores.
Córrego Bley, São Gabriel da Palha, Junho de 2017.
Por Roseli e Raul – MPA
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