11 de agosto de 2022
“O mundo não nos enxerga”. Um levantamento do IBGE estima (com base no último Censo, de 2010) que existam 5.972 comunidades quilombolas em 1.672 municípios em, presentes em todos os biomas do Brasil. Ainda assim, é uma população pouco vista, segundo percepção de Denildo Rodrigues, coordenador executivo da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).
A luta por visibilidade e direitos, a denúncia do desmonte de políticas públicas voltadas a essa população e também do acirramento dos conflitos no campo levaram cerca de três mil quilombolas à Brasília (DF) nesta quarta-feira (10). O ato Aquilombar, convocado pela Conaq, acontece na Fundação Nacional de Artes (Funarte).
É a segunda vez que uma mobilização quilombola deste porte acontece em Brasília. A última foi em 1995, quando completaram três séculos da morte de Zumbi dos Palmares. Seis meses depois, a Conaq foi fundada.
“Somos os guardiões invisíveis da floresta. Quando olhamos para a Amazônia, não nos enxergamos. Mas 68% do bioma amazônico é habitado por pessoas negras. Então a Amazônia é negra”, afirma Denildo, mais conhecido como Biko. “E quilombolas têm pagado um preço muito caro por proteger essa biodiversidade, inclusive com o corpo e o sangue do nosso povo preto”.
Segundo o relatório sobre Conflitos no Campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2021 houve um aumento de 418 territórios atingidos por violência em torno da terra. Destes, 28% são em territórios indígenas e 23% em terras quilombolas.
“Nós – as comunidades quilombolas, indígenas, tradicionais – somos a fronteira que impede o agro-hidro-minério-negócio de se consolidar no campo brasileiro”, avalia Biko Rodrigues. “Se não fôssemos nós ali, naquele espaço, a ganância e o capital já teriam acabado com toda essa biodiversidade.”
Ainda segundo a CPT, a violência em forma de humilhação atinge 25% dos homens e 40% das mulheres quilombolas. Entre 2011 e 2021, 21% das violências sofridas por mulheres foram estupros.
Destas quase seis mil localidades quilombolas no país, apenas 404 territórios são oficialmente reconhecidos e menos de 200 estão totalmente demarcados e titulados. Enquanto isso, a fila de espera para essa regulamentação no Incra supera 1.700 processos.
“Sofremos um desmonte de todas as políticas públicas de salvaguarda dos territórios quilombolas, a regularização foi a que sofreu o maior baque”, afirma Biko. “Em 2012, há 10 anos, os recursos para isso chegavam na ordem de R$70 milhões. Hoje não chega a R$85 mil reais”, denuncia.
No artigo Os quilombos que o Brasil insiste em ignorar, Selma Dealdina, secretária administrativa da Conaq, explica que “aquilombar” se refere a mais do que a forma verbal de se referir a um esconderijo feito nos tempos do regime escravista.
“Quilombo é um símbolo de resistência contra os opressores e também um lugar de acolhimento”, salienta Biko Rodrigues. “Palmares abrigou todos aqueles que eram excluídos. Inclusive as pessoas que vieram de outros continentes e que não tinham espaço na sociedade naquele período”, ilustra.
“Para defender o acesso à terra, a biodiversidade, a democracia do nosso país e lutar contra o desmonte das políticas públicas, lutar para que nosso povo não seja mais assassinado”, resume, “nós convocamos toda a sociedade para aquilombar.”
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