26 de agosto de 2018
O título deste texto remete a uma canção. O poeta e cantador Pedro Munhoz é autor desse tributo aos que lutam. São 8 perguntas cantadas, intercaladas por uma resposta que se faz refrão. Nestes dias de turbulência onde se espera do povo que assuma o protagonismo da luta e a escritura das linhas de seu destino, resgatar esse canto se faz urgente.
“Quem tem coragem de virar a página para escrever tudo de novo? Quem tem coragem de soltar a voz na língua do povo?”
Desde 31 de julho sete guerreiros e guerreiras estão em greve de fome em Brasília. Alimentam-se de esperança. O corpo, há quase três semanas recebendo apenas água e soro ressente-se da falta do alimento físico e se torna mais frágil; o espírito, reforçado a cada dia na certeza de um ideal, firma-se em resistência e torna-se um grito silencioso de alerta para mim, para ti, para nós todos e todas.
“Quem tem coragem de negar Deus diante do espelho? Quem tem coragem pelo menos uma vez pintar o mundo de vermelho?”
Sérgio, Gegê, Rafaela, Léo, Jaime, Vilmar e Zonália irmanam-se não em torno de um sonho, mas de uma necessidade. É fome contra fome. Mais que a falta de alimento da qual ressentem-se no radicalismo de sua ação, o que os move é o sentimento de indignação contra as injustiças que nos últimos dois anos se institucionalizaram no Brasil pelas mãos de um presidente sujo, de um parlamento omisso e de um sistema judicial que perdeu o rumo. È pelo povo mais simples, pelo pobre que voltou a sentir fome, frio e medo.
“Somos um, seremos mais, lado a lado e em frente. Um mais um nunca é demais, é poesia, é gente!”
Uma greve de fome é um ato pacífico, jamais um ato passivo. Representa a radicalidade daqueles que colocam a própria vida como objeto de um ideal justo, como meio de mobilização para fazer despertar um povo que não pode mais se comportar como “massa”. Repito: é um grito silencioso que percorrer nossos sentidos mais pessoais e nos chama à organizar e lutar.
“Quem tem coragem de assumir com firmeza os próprios atos? Quem tem coragem de abrir mão para ser anonimato?”
O que move a greve de fome não é o nome de um candidato ou a sigla de um partido. É a indignação repleta de santidade que os faz perplexos frente às entrelinhas do noticiário que transformam as gentes em números e tantas vezes não dão nome nem rosto aos que morrem de frio e de fome, aos que são fuzilados pelas costas, aos que tem seus sonhos rasgados pela violência e pela indiferença.
“Quem tem coragem de dizer não perante o que há de vir? Quem tem coragem se preciso for ser o primeiro a cair?”
Se as manchetes dos grandes jornais ou as emissões das redes de televisão não lhes dão voz nem vez, é pela boca do povo que seu grito ganhará a sonoridade marcante para chegar até cada casa e até cada coração. Se os covardes que se escondem atrás da conveniência do anonimato das redes os atacam, é no abraço do povo que serão acolhidos, protegidos e multiplicados. Hoje eles são sete, amanhã seremos milhões.
“Somos um, seremos mais, lado a lado e em frente. Um mais um nunca é demais, é poesia, é gente!”
Sim, é como na resposta que Pedro Munhoz canta às perguntas que faz na canção: somos todos um só. Somos a fome deste sete que lutam em nosso nome. Seremos mais, organizados, pareados em esperança, caminhando lado a lado e seguindo em frente. Somados, cada um a seu modo, cada um de seu espaço, comporemos a poesia de nossos dias, escreveremos a história de nosso tempo e aos filhos dos nossos filhos legaremos a certeza de que com coragem colorimos esse tempo cinza. Obrigado guerreiros e guerreiras, sua fome não será em vão.
Por Marcos Antonio Corbari – Jornalista, militante do MPA
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