24 de maio de 2018
Os participantes da Consulta Regional da América Latina e Caribe as Organizações da Sociedade Civil (OSC) sobre a Implementação do Artigo 9 do Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e Agricultura (TIRFAA/FAO), tornaram público nesta primeira quinzena de maio a Declaração redigida durante o evento realizado entre os dias 17 a 20 de abril, no Centro Territorial de Cooperação do MPA em Seberi, Rio Grande do Sul – Brasil.
Organizado pelo Comitê Internacional de Planejamento (CIP) pela Soberania Alimentar por meio de seu Grupo de Trabalho sobre Biodiversidade Agrícola o evento reuniu mais de 40 pessoas entre camponeses, trabalhadores rurais, povos indígenas, organizações de apoio e representantes da academia de 16 países, e contou ainda, com a presença da uma representação do Secretariado do Tratado e de representantes dos governos do Brasil e do Equador.
O TIRFAA/FAO assegura o Direito dos Agricultores e Agricultoras de conservar, utilizar, intercambiar e vender sementes e outros materiais de propagação conservados nas Unidades Camponesas de produção e a participar dos processos de tomada de decisões sobre a utilização dos recursos fitogenéticos para a alimentação e agricultura.
Confira a Declaração na Integra:
Declaração dos participantes da
Consulta Regional da América Latina e Caribe sobre a Implementada dos Direitos dos Agricultores – TIRFAA
Seberi, Brasil, 17 a 20 de abril de 2018
Introdução
As e os 40 participantes representantes de organizações camponesas, indígenas, de mulheres e de pastores na Consulta Regional de América Latina e Caribe sobre a Implementação dos Direitos dos Agricultores, provenientes de 13 países da América Latina e Caribe, reunidos em Seberi, Rio Grande do Sul – Brasil, entre os dias 17 e 20 de abril de 2018; celebramos a oportunidade de nos encontrar para seguir construindo alianças, vínculos e intercâmbios, fortalecendo nosso compromisso com a defesa das sementes para a Soberania Alimentaria.
Nestes 4 dias compartilhados reafirmamos mais uma vez o papel fundamental dos povos da América Latina e Caribe como centro de origem em agrobiodiversidade e cultura, já que daqui tem surgido boa parte das sementes que hoje alimentam a humanidade. O milho, sagrado para os povos de Mesoamérica, o feijão, o tomate e a batata são apenas alguns dos cultivos que nossos povos originários criaram, domesticaram e deixaram aos povos do mundo para sua alimentação.
Está claro para nós que esta biodiversidade agrícola evoluiu e tem uma forte correlação com a imensa diversidade cultural que desde o Alasca até a Terra do Fogo (PACHAMAMA) foi gerada por milhares de anos e hoje, segue viva na resistência dos povos originários que, apesar dos mais de 500 anos de genocídio, desapropriação e perseguição ascendem as chamas da esperança para o futuro de todos os povos do mundo.
No entanto, atualmente, a imposição de sistemas industriais de produção agrícola, os projetos extrativistas, megaprojetos de infraestrutura e a criminalização dos povos estão ameaçando a possibilidade de subsistir em seus territórios, está devastando a biodiversidade em todas as regiões.
Desta maneira, não só os nossos povos estão ameaçados, mas também as sementes, animais, plantas, florestas, selvas que pertencem a ecossistemas únicos que estão desaparecendo rapidamente e com o passar do tempo se extinguirão para sempre, afetando gravemente o meio ambiente, o clima, água, aumentando a fome, a pobreza, a desigualdade ameaçando a vida no planeta à beira da extinção.
Nossas lutas foram iluminadas, nos últimos anos, pela presença das mulheres em todos os espaços de construção social, questionando a violência e o sistema patriarcal presentes em todas as esferas de nossas vidas. Todas e todos nós fazemos estas perguntas e, por meio da construção de outros tipos de vínculos, propomos transformar nossos vínculos familiares, comunitários, regionais e internacionais construindo relações de equidade, respeito e cooperação. Nesse sentido e vendo a necessidade dessas mudanças, também se refletem na linguagem é que usamos em todo o documento a expressão “agricultoras e agricultores” em vez de “agricultor”.
É importante enfatizar que quando falamos de “povos” neste documento, nos referimos aos povos originários, indígenas, camponesas e camponeses, comunidades afrodescendentes, pescadoras e pescadores artesanais, coletoras e coletores, pastoras e pastores, mulheres e a todas as comunidades locais que, desde seu trabalho, produzem alimentos e contribuem para a manutenção da diversidade agrícola.
Também queremos enfatizar que, durante as últimas duas décadas, a América Latina contribuiu para uma nova visão em relação à natureza, construindo um novo paradigma em torno dela que implica reconhecê-la como sujeito de direito. Em torno desse novo conceito, foram desenvolvidos princípios, legislação (inclusive a nível constitucional, como no caso do Equador ou em algumas sentenças do Tribunal Constitucional na Colômbia, reconhecendo o rio Atrato e mais recentemente a Amazônia) e lutas que hoje contribuem para novas visões em todo o mundo. Sendo as sementes, os animais, a água, a floresta parte da natureza e sabendo que os seres humanos também fazem parte dela, nós os entendemos como sujeitos de direito e nos comprometemos a defendê-los como tais.
Igualmente reiteramos nossa rejeição ao uso, em todas as circunstancias, das Tecnologias de Restrição no uso Genético (sementes “Termineitor”) que se encontram em moratória pelo Convenio sobre a Diversidade Biológica e exigimos sua proibição definitiva.
Exigir que os Direitos dos Agricultores e Agricultoras reconheçam, protejam e promovam a produção agroecológica de alimentos nos sistemas de produção familiar e dos povos é o ponto de partida de nosso trabalho e exigimos que os Estados os reconheçam e não imponham um único modelo de produção e comercialização, mas abram a possibilidade de que os agricultores possam comercializar suas sementes sob suas próprias condições.
Queremos neste momento tão importante para o povo venezuelano expressar nossa solidariedade com o Movimiento Semillas del Pueblo que tanto tem feito pela construção da Lei de Sementes da Venezuela, um exemplo para o mundo, e seu plano popular para a conservação e resgate de variedades locais campesina, indígenas e afrodescendentes.
Por último, reiteramos que o nosso compromisso na defesa das sementes como parte da busca pela Soberania Alimentar por meio da Agroecologia, convencidos de que os povos podem alimentar toda a humanidade (como já o fazem com a maior parte dela) terminando com o flagelo vergonhoso da fome, pobreza, desigualdade e continuando, como temos feito há milhares de anos, com a produção em harmonia com a natureza.
Princípios Fundamentais
A Consulta Regional da América Latina e do Caribe sobre a Implementação dos Direitos dos Agricultores e Agricultoras (doravante referida como “Consulta”) reconhece as sementes como patrimônio biocultural dos povos a serviço da humanidade e como Direitos Coletivos. Portanto, manifesta que elas não podem ser objeto de qualquer tipo de propriedade intelectual (sejam eles direitos ou patentes de criadores).
Considerando que as mulheres tem sido e são fundamentais na criação, coevolução e preservação da agrobiodiversidade, reconhecemos seu papel e exigimos sua participação em todas as instâncias participativas e de tomada de decisões em nossas organizações e em todos os processos nos quais nossas organizações são convidadas a participar.
Outro princípio é o reconhecimento da visão de mundo dos Povos sobre as sementes, como um sujeito de direito e no marco dos direitos da natureza. Nos declaramos defensores desses direitos e exigimos que se respeite sua territorialidade, o controle dos territórios e sua biodiversidade por parte dos Povos.
Outro princípio básico é que o Consentimento Livre, Prévio e Informado[1] (CLPI) deve ser aplicado a qualquer iniciativa que possa afetar a biodiversidade agrícola, o conhecimento, a autonomia e os territórios das comunidades locais e dos povos indígenas. Esclarece-se que o CLPI é um direito que deve ser exercido de maneira legítima, transparente e efetiva, que respeite as práticas locais e que inclua a possibilidade de que o resultado seja a negação de iniciativas externas.
Nenhuma medida governamental que limite as formas próprias de organização e o direito dos agricultores e das agricultoras de resgatar, proteger, multiplicar, melhorar, selecionar, conservar, utilizar, trocar e vender (entre Povos e suas organizações) suas próprias sementes.
Os sistemas tradicionais e ancestrais de manejo de sementes nativas e crioulas não são e não devem ser considerados “sistemas informais”, mas, são um direito consuetudinário e são os principais sistemas para a criação da biodiversidade agrícola.
Rejeitamos a agricultura industrial com suas sementes transgênicas e o uso massivo de agrotóxicos. Também rejeitamos as novas técnicas de manipulação genética propostas pelas corporações, que incluem os novos transgênicos, biologia sintética, edição genética (CRISP-R), sementes “termineitor” e a desmaterialização genética das sementes; porque representam uma ameaça para os nossos povos.
Consideramos muito importante a implementação dos Direitos dos Agricultores e Agricultoras, o apoio do Tratado para a aprovação da Declaração dos Direitos dos Camponeses e outras Pessoas que Trabalham em Áreas Rurais, que será discutido no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidos em junho deste ano.
Nossas Demandas
O inventário da comunidade deve ser reconhecido pelo Estado como parte do direito à autodeterminação dos povos.
Sementes nas mãos dos povos para a Soberania Alimentar!
[1]Já reconhecido por outros Tratados Internacionais como o artigo 8j. da Convenção sobre Diversidade Biológica, Convenção Nº 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em países independente, Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas e Diretrizes Voluntárias sobre a Governança Responsável da Posse de Terra, Pesca e Florestas no contexto da Segurança Alimentar Nacional.
Organizações que assinam a Declaração:
Organizações campesinas internacionais promotoras do encentro
Comité Internacional de Planificacion por la Soberania Alimentaria;
Alianza por la Soberania Alimentaria de los Pueblos de América Latina y El Caribe;
Organizações campesinas regionais
Enlace Continental de Mujeres Indigenas de las Americas;
Coordinadora Latinoamericana de Organisaciones del Campo (CLOC);
Marcha Mundial de Mulheres (MMM);
Movimento Agroecologico de América Latina y El Caribe;
Confederación Internacional de Organizaciones de Productores Familiares del Mercosul Ampliado (COPROFAM) – Uruguai;
Consejo Internacional de Tratados Indígenas (CITI);
La Via Campesina;
–
Organizações campesinas nacionais
Alianza Mundial de Pueblos Indigenas Mobiles – Peru;
Corporación para el Desarrollo Sustentable (CORDES) – Colômbia;
Articulación Pacari de Plantas Medicinales del Cerrado – Brasil;
Asociación de Organizaciones de Los Cuchumatanes (ASOCUCH) – Guatemala;
Campaña Semillas del Pueblo – Venezuela;
Coordinadora de Empresas Asociativas Rurales Departamentales -Paraguay;
Colectivo Agroecológico Aj Mayon – Guatemala;
Confederación Nacional de Mujeres del Campo (CONAMUCA) – República Dominicana;
Confederação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) – Brasil;
Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) – Brasil;
Federación Nacional Sindical Unitaria Agropecuaria (Fensuagro) – Colômbia;
Red Nacional de Agricultura Familiar (RENAF) – Colômbia;
Red Nacional Por la Defensa de la Soberanía Alimentaria (REDSAG)- Guatemala;
Movimiento Nacional Campesino y Indígena (MNCI) – Argentina;
Organizações de apoio
Amigos de la Tierra América Latina y Caribe (ATALC);
Associação Brasileira de Agroecologia (ABA-Agroecologia) – Brasil;
Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) – Brasil;
Centro Internazionale Crocevia – Itália;
FIAN Brasil;
GRAIN – Argentina;
Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) – Brasil;
Grupo Semillas – Colômbia;
Terra de Direitos – Brasil;
Núcleo Amigos da Terra (NAT) – Brasil.
Por Comunicação MPA
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