4 de novembro de 2020
Atividade teve como painelistas Tarso Genro e José Genoíno, contando ainda com a participação de militantes dos 17 estados onde o MPA atua
Marcos Corbari – Coletivo de Comunicação do MPA
Na última sexta-feira, 30, o Movimento dos Pequenos Agricultores realizou uma atividade coletiva online com objetivo de debater o tema das Eleições 2020 e sua relação com as pautas dos movimentos sociais, em especial, com as demandas e projetos do campesinato.
Participaram dirigentes e militantes dos 17 estados onde o movimento tem atuação, bem como parceiros estratégicos que vem atuando em consonância com a pauta camponesa.
Para analisar a conjuntura foram convidados Tarso Genro (ex-prefeito de Porto Alegre, governador do RS e ministro da Educação e Justiça) e José Genoínio (deputado federal por 5 mandatos e ex-presidente do Partido dos Trabalhadores).
Ao abrir a transmissão, as dirigentes Rafaela Alves (Sergipe) e Josineide Costa (Piauí) relembraram que o MPA recentemente publicou um documento norteador propondo reflexões e posturas referentes à eleição, compartilhado há cerca de duas semanas com seus /suas dirigentes e base de militância.
Conforme exposto, a participação do MPA no pleito deve ser norteada pelo fortalecimento da reflexão sobre os rumos da política local, bem como apresentar reivindicações e questões que interessam ao conjunto da população, aprofundando o sentido da participação popular e da democracia. O documento afirma ainda ser necessário compreender as disputas de ideias e de projetos que se explicitam nesse período, conectando as questões do movimento a um Projeto Popular para o Brasil.
José Genoíno, ex-guerrilheiro e preso político no período da Ditadura Militar, eleito deputado federal por São Paulo em 5 mandatos sucessivos, exerceu o cargo de presidente nacional do PT e atualmente dedica-se às instâncias de formação e mobilização da militância nas bases do partido e junto aos movimentos sociais.
– A conjuntura atual e as eleições tem seu significado, seu sentido para o país e para os nossos territórios -, explicou Genoíno, lembrando que o processo eleitoral de 2020 “não é uma eleição qualquer”, mas ao contrário, “se dá se dá em um momento crucial da luta política, da luta de classes no país”. A crise aguda em que estamos submersos – em suas dimensões sanitária, econômica, social, ambiental, cultural – gera repercussões que refletem nos cenários local e nacional, chegando até mesmo a repercutir em âmbito internacional: “Uma crise com essas dimensões se reflete no cenário micro e no macro, entre o imediato e o futuro, que traz a necessidade da gente apresentar rumos, soluções e alternativas”, explicou, relembrando também que “a crise por si só não muda a sociedade nem o país, vai depender da luta, do fator humano, da consciência, da organização da classe trabalhadora, dos movimentos populares, da militância socialista para enfrentar a crise numa perspectiva transformadora”.
– A crise tem aspectos institucionais, revelando como o governo que está autoritariamente governando o país tem compromissos com o modelo econômico financeirizado, dependente, associado à hegemonia norteamericana -, apontou. “Essa crise tem um quadro de desagregação social, de aprofundamento, de barbárie”, acrescentou, citando xomo exemplos os índices recorde de desemprego (14% da população), de famílias em situação de fome (10 milh~eos de pessoas), de brasileiros e brasileiras que tem algum tipo de dificuldade na alimentação (entre 70 e 80 milhões de pessoas), negócios que estão quebrando, informalidade que cresce a cada dia, pessoas que para sobreviver estão dependendo das ações de solidariedade desempenhadas pelos movimentos sociais e populares.
– É um quadro de extrema gravidade em que o problema social se agudiza muito e nesse sentido a eleição é um momento importante para trazer a temática nacional para o debate local, fundir o micro e o macro, trazer a disputa politica da agenda do país com reflexo com a agenda local, e vice-versa -, afirmou Genoíno, para quem a eleição é um espaço decisivo para “a disputa de consciências, para esclarecer corações e mentes, para esclarecer politicamente a consciência do povo no sentido das nossas alternativas”. Partindo desse prisma, Genoíno aponta para a importância de conquistar espaço nas prefeituras e câmara de vereadores, de modo a acumular forças e sinalizar para um programa de governo que possa de fato mudar a vida do povo.
– Nós não podemos simplesmente ocupar o governo e ficar no governo, nós temos que mudar a vida do povo naquilo que é nosso programa em relação à saúde, educação, assistência social, agricultura familiar, apoio a pequena e media empresa, na moradia popular, na taxação dos mais ricos no âmbito dos municípios”. Segundo o dirigente, para viabilizar isso tudo é preciso começar assumindo o papel transformador da radicalidade: “Precisamos aplicar aquilo que a crise ensina. A crise radicaliza por si só e nós não podemos ter medo da radicalização. Nós temos que ter lucidez para afirmar as soluções essa situação. Nós temos que mostrar que os nossos territórios não são ilhas isoladas através de uma muralha intransponível dessa crise geral, muito pelo contrário, está conectada e refletida através dela”.
No alinhavo de suas ideias, Genoíno retomou um tema que tem defendido em diversos espaços: “Só conseguiremos enfrentar a conjuntura atual se encontrarmos formas de viabilizar protagonismo do povo, discutir e viabilizar formas de participação popular”. Além do segmento camponês, que compunha o público com quem dialogava, lembrou que se faz necessário uma grande aliança campo-cidade entre os diversos setores de trabalhadores, buscando agregar ainda outros segmentos de interesse comum como o movimento por moradia, o movimento LGBTQUI+, indígenas, movimentos de mulheres, movimento negro, atingidos por barragens, sem-terras, entre outros. “É preciso despertar a consciência de classe e tornar claro a cada um que a sua situação não deve ser encarada num parâmetro de homgeinização dentro de uma massa, mas sim exercer seu protagonismo e a partir da sua realidade pessoal, do seu território, da sua localidade assumir o protagonismo que lhe cabe na luta de classes que vivemos, com radicalidade e consciência”.
Tarso Genro, advogado, jornalista, professor universitário e ensaísta. Vinculado ao Partido dos Trabalhadores, já exerceu dois mandatos como prefeito de Porto Alegre e um como governador do RS, além de já ter ocupado três ministérios (da Educação, das Relações Institucionais e da Justiça) e o cargo de presidente nacional do PT.
– A contribuição que os movimentos sociais podem dar nessa conjuntura, durante e pós-processo eleitoral é extraordinariamente importante – apontou Tarso. “A luta política de hoje nas micro, pequenas e médicas cidades é decisiva e nós precisamos recuperar esse debate a partir de propostas concretas”, acrescentou. Na opinião do ex-governador do RS, o processo de transformação democrático-revolucionário do país vai se dar de maneira lenta, de maneira cumulativa, uma vez que “dificilmente vamos ter uma ruptura política grande como ocorreu em outros países no século passado”.
Um ponto em específico destacado por Tarso, a ser desenvolvido a partir dos territórios, nas localidades, é o aprofundamento da relação entre o trabalhador camponês e o trabalhador urbano, fomentando o rompimento de expedientes históricos de exploração que puderam ser notados em diversos regimes, mas que se aprofundam sob os expedientes do capitalismo. “O que precisa acontecer hoje – e nós já temos exemplos concretos – é que esse processo de articulação da cidade com o campo seja intensificado”, acrescentou, relembrando iniciativas desenvolvidas por governos populares que aproximam produtores de alimento dos trabalhadores que precisam para seu consumo.
– Nós tivemos algumas experiências nesse processo da pandemia, na distribuição de alimentos, rompendo as formas de distribuição do capitalismo, interrompendo, bloquenado o ciclo de reprodução sócio-metabólica do capital, que se dá pela permanente presença de estruturas de apropriação e distribuição, escravizando pelo preço nos dois lados”. Para Tarso é possível, a partir das prefeituras, incentivar formas superiores de relação cidade-campo, um sistema de alianças que dê suporte para a sustentabilidade, interferindo nesse processo de circulação, fazendo uma relação direta entre os trabalhadores da cidade e os trabalhadores do campo, pelas formas diretas de articulação no processo de circulação da produção e do consumo”. Oportunizar que os trabalhadores hoje explorados no campo apresentem seus produtos aos trabalhadores hoje explorados na cidade seria uma “forma concreta de articulação da solidariedade operário-camponesa”.
– Nós aqui estamos enfrentando um governo fascista, temos que acumular forças para os embates eleitorais e para outros embates mais pesados, como a crise ambiental, crise econômica e a crise sanitária -, aponta. “O que as prefeituras populares podem ajudar é iniciar este novo sócio-metabolismo de reprodução social que é estabelecer vínculo direto da produção com o consumo, da classe média-baixa, dos trabalhadores, das organizações que as cidades podem compor de forma solidária para romper com essa circulação capitalista clássica, ir colocando ali o germe de um novo modo de vida, particularmente em relação aos alimentos sadios e preparando uma visão de futuro com soberania alimentar, que é estratégica para um país como o nosso”.
Para Tarso é simbólico o que precisamos buscar no dia 15 de outubro para além dos resultados das urnas: “Essas eleições servem para que possamos observar onde essas forças podem ser agregadas de forma fortemente articulada, para que se possa constituir uma aliança entre os pobres do campo e os pobres da cidade, uma base de resistência cívica e moral, de políticas de massa, para o enfrentamento ao fascismo”, concluiu.
Documento
O MPA reafirma sua convicção enquanto Movimento Social em manter-se firme com a pauta de um projeto de vida para o povo do campo e da cidade, erguendo a bandeira do Plano Camponês para desenvolver o campo e a produção de alimentos saudáveis através da agroecologia, como caminho para a justiça social, superação das desigualdades e construção das necessárias condições de vida digna para o povo camponês e emprego para o povo da cidade. Para ler o documento com as posições do MPA, na íntegra, CLIQUE AQUI e acesse a verão em PDF.
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