23 de março de 2017
Em treze estados do país, milhares de atingidos por barragens realizaram atos, ocupações e marchas contra o desmonte da previdência, as tentativas de privatizações do setor energético e as violações de direitos.
Todo dia 14 de março é marcado por mobilizações ao redor do mundo. Isso ocorre devido à instauração, em 1991, do Dia Internacional de Luta Contra as Barragens, pelos Rios, pela Água e pela Vida. Neste ano não foi diferente: milhares de pessoas se mobilizaram em 13 estados brasileiros.
No plano nacional, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) reivindicou a revisão da Tarifa Atualizada de Referência (TAR) e cobrou a instauração da Política Nacional das Populações Atingidas por Barragens (PNAB).
Tarifa Atualizada de Referência (TAR)
A construção de hidrelétricas no Brasil é responsável pela desestruturação de comunidades, perdas econômicas e impactos sociais imensuráveis. Para mitigar ou diminuir esses danos, a Constituição Federal de 1988 instituiu a Contribuição Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH), regulamentada dois anos depois pela Lei 8001/1990. O principal objetivo da CFURH é compensar a inundação das áreas atingidas por barragens e seu recurso é distribuído entre municípios (45%), estados (45%) e união (10%).
O montante dos recursos da CFURH advém da Tarifa Atualizada de Referência (TAR), que taxa a geração hidrelétrica. Todavia, no início desse ano, a ANEEL através de uma resolução diminuiu de R$ 93,35/MWh para R$ 72,20/MWh o valor da TAR, o que reduz os recursos para compensação financeira das áreas atingidas por barragens.
O MAB reivindica a revisão da TAR, para aumentar os recursos da CFURH, além de cobrar que esse recurso seja destinado diretamente a programas de reestruturação dos territórios afetados pelas barragens.
PNAB
O movimento também cobra a instauração da Política Nacional das Populações Atingidas por Barragens (PNAB). Para o MAB, existe a necessidade de criação de um marco jurídico-legislativo que defina os direitos das populações atingidas. Além disso, essa política deveria especificar um órgão para tratar a questão dos atingidos e um fundo com recursos destinados à reparação dos danos.
Mobilizações locais
Além das pautas nacionais, cada região também apresentou diversas pautas de reivindicação durante as mobilizações desta terça-feira. Amanhã, quarta-feira (15), os atingidos se somam às mobilizações, organizadas pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, contra a reforma da previdência proposta pelo governo golpista de Michel Temer.
Confira as mobilizações por estados:
Espírito Santo
Desde o início da manhã de terça-feira (14), atingidos pelo rompimento da barragem de rejeitos de Fundão ocuparam a linha de trem da mineradora Vale, em Colatina (ES). Pescadores, meeiros e agricultores das cidades capixabas de Aracruz, Baixo Guandu, Colatina, Linhares e São Mateus permaneceram nos trilhos para denunciar os desmandos da Vale, por meio da Fundação Renova, na vida dos atingidos.
A Fundação Renova foi instaurada pelo “acordo” entre as mineradoras (BHP Billiton, Samarco e Vale) e os governos estaduais (Espírito Santo e Minas Gerais) e governo federal para “recuperar” a bacia do rio Doce. Todavia, o órgão concede poderes apenas às empresas e exclui do processo as vítimas do crime ocorrido em novembro de 2015 em Mariana (MG).
Os atingidos também reivindicam o reconhecimento como atingidas das comunidades de Foz Norte e Foz Sul, que contém milhares de famílias. Além disso, cobra que a assessoria técnica em toda a Bacia do Rio Doce seja indicada pelos próprios atingidos.
Minas Gerais
Cerca de 300 atingidos ocuparam na manhã de segunda-feira (13) a sede da Companhia Elétrica de Minas Gerais (Cemig), em Belo Horizonte. Os atingidos permaneceram no prédio até o final do dia, quando se reuniram com o presidente da estatal, Bernardo Alvarenga, e representantes do governo do estado.
Integrantes do MAB criticaram a postura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que reprovou o Projeto de Lei (PL) 3.312/16, que propõe a Política Estadual dos Atingidos por Barragens e outros Empreendimentos (Peabe).
Além disso, o movimento apresentou os impactos das Usinas Hidrelétricas de Irapé, localizada no Vale do Jequitinhonha, e Aimorés, no leste de Minas Gerais, na vida das populações atingidas.
Produção de alimentos, pesca e consumo de água foram prejudicados após a inauguração da hidrelétrica Irapé, em 2006. Além disso, centenas de pessoas não foram reconhecidas como atingidas pelo governo e ficaram de fora das políticas indenizatórias.
Já Aimorés inundou praticamente todo o município de Itueta. Sua reconstrução foi realizada sem a autonomia e participação dos atingidos. Isso ocasionou uma perda de vínculos e a construção de uma cidade desvinculada com as necessidades locais e a identidade regional.
Durante a reunião, o governo se comprometeu em realizar um seminário na Assembleia Legislativa de Minas Gerais com a participação dos deputados e do governo para demonstrar a importância da Peabe para o desenvolvimento do estado. Também ficou acordado a abertura de uma mesa de mediação de conflitos para garantir o direito dos atingidos em Fumaça, Emboque/Granada, Grão Mogol, Irapé, Setubal e Berizal, além de outras pautas.
Na terça-feira (14), os atingidos realizaram um ato em frente à 12ª Vara Federal, em Belo Horizonte, para protestarem contra o acordo preliminar entre as mineradoras (BHP Billiton, Samarco e Vale) e o Ministério Público Federal (MPF), que prevê a participação do Banco Mundial como mediador de conflitos na região afetada pelo crime ocorrido em Mariana (MG) e retira a autonomia e participação dos atingidos.
São Paulo
Em São Paulo, atingidos de diversas regiões do estado se reúnem na capital para a realização de uma audiência pública. O evento ocorrerá nesta terça-feira (14), às 18 horas, no Auditório Antônio Vilella da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, com o objetivo de debater a recuperação e o desenvolvimento das comunidades atingidas, além da questão energética. A audiência contará com a participação de deputados estaduais e federais, além de outras organizações populares.
Paraná
Na manhã de terça-feira (14), atingidos por barragens realizaram uma audiência pública na Assembleia Legislativa, em Curitiba, com a participação dos deputados que compõem a Frente Parlamentar em Defesa dos Atingidos por Barragens do Estado do Paraná.
As famílias atingidas denunciam as diversas violações de direitos ocorridas nas regiões onde há barragens e, também, onde há construções em andamento, como é o caso da Usina Hidrelétrica Baixo Iguaçu.
Na audiência, também foi apresentada a pauta dos atingidos do estado, entregue aos parlamentares, ao Instituto Ambiental do Paraná (IAP), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Companhia Paranaense de Energia (Copel) e prefeituras.
Na pauta consta a implantação de planos de desenvolvimento econômico e sustentável às comunidades que foram atingidas e às remanejadas de seus territórios, além da regularização fundiária das áreas afetadas pelos projetos de barragens.
Também foi denunciado a situação das famílias atingidas pela Usina Hidrelétrica Baixo Iguaçu, que estão há quase quatro anos cobrando seus direitos junto ao Consórcio responsável pelo empreendimento e ao governo do estado do Paraná, que tem se mostrado omisso na resolução efetiva dos problemas gerados aos agricultores paranaenses.
A partir dessa audiência foi encaminhada a construção de um calendário de audiências públicas em todas as regiões, discutindo a situação das populações atingidas por barragens para subsídio da construção da Política Estadual de Direitos dos Atingidos por Barragens (PEAB) no Paraná.
Rio Grande do Sul
Nesta terça-feira (14), atingidos por barragens realizaram no Plenarinho da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, o Seminário “Questão Energética e Direitos: atualidades e perspectivas”.
O seminário foi realizado com o objetivo de aprofundar uma análise sobre as contradições e disputas da questão
energética nesta conjuntura, a fim de debater sobre a necessidade de se garantir as riquezas naturais e energéticas para beneficio do povo brasileiro.
Nos últimos dias foi anunciado reajuste da tarifa de energia elétrica que aumentará em torno de 11% as contas de luz, mas ao mesmo tempo também foi anunciada diminuição de 20% da CFURH (Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos) que é um imposto cobrado às hidrelétricas. Essa diminuição, junto com o aumento da tarifa da energia elétrica, significa elevação dos lucros das empresas donas das hidrelétricas que são em grande maioria multinacionais.
Santa Catarina
Durante esta terça-feira (14) ocorreu em Águas de Chapecó, oeste do estado de Santa Catarina, o “Encontro com Atingidos pela Usina Hidrelétrica Foz do Chapecó no Rio Uruguai”. Após seis anos da construção da obra, centenas de famílias de pescadores e agricultores reivindicam a reestruturação das comunidades ribeirinhas; reassentamento dos pescadores; implantação imediata dos pontos de apoio a pesca com tanques; entre outros pontos.
Hoje também pela manhã ocorreu outro encontro em Santa Catarina, no município de Vargem, na região serrana do estado. Os atingidos pala barragem de São Roque, no rio Canoas, pertencente ao grupo Engevix, com largo histórico de violações a população atingida na região, denunciaram a precariedade nas indenizações e falta de diálogo com a empresa. Eles exigiram a imediata compra de área de terra para reassentamento e reconhecimento dos direitos negados.
Bahia
Nesta terça-feira (14), o MAB realizou manifestações em todo o estado da Bahia em defesa dos direitos humanos e da soberania do povo baiano. Em atos nos municípios de Juazeiro, Santa Maria da Vitória e Salvador foram cerca de 1000 pessoas mobilizadas. A ação marcou o “Dia Internacional de Luta contra as Barragens”.
Em Juazeiro, 250 atingidos ocuparam a sede do Serviço Territorial de Apoio à Agricultura Familiar (SETAF), órgão do governo federal responsável pelas políticas no território. Já em Santa Maria da Vitória, a ocupação ocorreu no Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), com aproximadamente 450 pessoas. Em Salvador, a ação foi realizada em conjunto com movimentos sociais e sindicais do estado, com cerca de 300 manifestantes.
Ceará
Já na segunda-feira (13), atingidos iniciaram a Jornada de Lutas no Ceará com a ocupação da rodovia CE-422, em frente à Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), em São Gonçalo do Amarante, para denunciar a negação de direitos.
Tendo entre as principais donas a Vale (antiga estatal Vale do Rio Doce, privatizada na década de 90 por Fernando Henrique Cardoso), a Companhia Siderúrgica do Pecém é um grande empreendimento que promete injetar bilhões na economia cearense. Contudo, o processo de exploração e produção de lâminas de aço a partir do carvão mineral
produz um conjunto de rejeitos que vêm afetando as famílias do entorno. Pó de carvão e gases, principalmente, têm provocado uma situação insustentável na vida das famílias, a exemplo da comunidade Nova Vida, distrito de Parada, município de São Gonçalo do Amarante.
Na terça-feira (14), atingidos e sindicalistas do MOVA-SE (Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público do Estado do Ceará) e da CUT Ceará realizaram no início da manhã uima panfletagem e agitação no centro de Fortaleza para conversar com os trabalhadores sobre a reforma da previdência do golpista Michel Temer, que tira do trabalhador do campo e da cidade o direito de se aposentar.
Maranhão
Nesta terça-feira (14), Dia Internacional de Luta contra as Barragens, cerca de 350 pessoas ameaçadas por projetos de barragens na bacia do rio Parnaíba, realizaram ato em frente à Companhia Energética do Maranhão (CEMAR), na cidade de Timon (MA), para cobrar o acesso e melhoria no serviço de energia elétrica, denunciar as altas tarifas cobradas pela empresa e também denunciar o desrespeito no tratamento às comunidades.
A CEMAR pertence ao setor da economia (distribuição de energia) de maior PIB em 2016. Isso garante à companhia a posição de 75° maior empresa em receita líquida do Brasil (num ranking de 1000 maiores) e de 10° em rentabilidade do setor elétrico, com crescimento da receita líquida em 466% entre 2003 e 2015. Mesmo sendo uma das empresas de maior rentabilidade, a CEMAR fornece um dos piores serviços de energia elétrica do país.
Piauí
Nesta terça-feira (14), cerca de 350 pessoas ameaçadas por projetos de barragens na Bacia do Rio Parnaíba, ocupam as ruas de Teresina para denunciar a proposta de desmonte da previdência, a privatização das distribuidoras de energia (Cepisa) e saneamento (Agespisa) do estado do Piauí, o aumento nas contas de luz e para reivindicar as pautas locais do movimento.
Pará
Em Marabá, cerca de 200 integrantes do MAB foram às ruas nesta terça-feira (14). Os manifestantes, de comunidades ameaçadas pela Usina Hidrelétrica de Marabá, exigiram políticas públicas, regularização fundiária e incentivo à produção.
Em marcha, os militantes visitaram três órgãos: Secretaria de Educação, Secretaria de Agricultura e Incra, para apresentar a pauta de reivindicações. A atividade integrou a Jornada Nacional de Lutas do MAB por ocasião do 14 de Março, “Dia Internacional de Luta Contra as Barragens, pelos Rios, pelas Águas e pela Vida.
Já em Altamira, também nesta terça-feira, aproximadamente 300 manifestantes organizados no MAB ocuparam a Casa de Governo, representação do governo federal. Os atingidos denunciaram as violações de direitos com a construção da Usina Hidrelétrica Belo Monte e a ameaça de uma nova tragédia socioambiental na região com a instalação do projeto de extração de ouro da transnacional Belo Sun.
Rondônia
Na manhã desta terça-feira (14), cerca de 200 integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) ocuparam a superintendência do Ibama, em Porto Velho (RO), para cobrar os direitos dos atingidos pelas usinas hidrelétricas de Santo Antônio (Santo Antônio Energia) e Jirau (Energia Sustentável do Brasil), ambas construídas no rio Madeira.
Também foi realizada uma ocupação na prefeitura de Porto Velho, como forma de reivindicar uma reunião com o prefeito Hildon Chaves. Foi cobrado do prefeito um plano de desenvolvimento para as comunidades atingidas.
Distrito Federal
Nesta terça-feira (14), representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e da Plataforma Operária e Camponesa da Energia se reuniram no Senado Federal, em Brasília, onde foi acertado o apoio de alguns senadores à pauta de reivindicação dos atingidos. O ponto principal é a criação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), do Fundo Nacional para projetos de recuperação e desenvolvimento de áreas atingidas e de um órgão especial que trate dos direitos dos atingidos.
Ficou acertado que os principais problemas atuais dos atingidos, como no caso das famílias afetadas pela Usina Hidrelétrica Baixo Iguaçu no Paraná, podem ser incluídos numa audiência pública especial no Senado Federal.
Também ficou acertado que a Plataforma Operária e Camponesa da Energia se articulará com a Frente Nacional em Defesa da Soberania para levar adiante a luta da energia e petróleo para educação, saúde, emprego e direitos.
Na avaliação das entidades, houve uma grande sensibilização dos senadores presentes, tanto para a luta em defesa dos direitos dos atingidos, como também em relação à questão da energia no país como ponto fundamental para a soberania nacional.
Senadores também confirmaram que estarão presentes no mês de outubro no Rio de Janeiro, durante o Encontro Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens. Ainda nesta semana, serão encaminhadas as audiências públicas e a articulação nacional em defesa da energia.
Por Comunicação MAB
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