20 de setembro de 2022
Geisa Marques
Edição: Daniel Lamir
Brasil de Fato | Redação
Açaí, jambu e farinha de carimã. Esses são alguns dos alimentos que estão diretamente ligados à cultura alimentar da região Norte do Brasil. Umbu, palma e inhame, por sua vez, estão associados ao Nordeste. O Centro-Oeste tem pequi e gueroba. Laranja, couve e feijão-branco aparecem na lista do Sudeste. Nectarina, lentilha e muricato são alguns dos alimentos encontrados no sul do país.
Esses e outros itens constam na segunda edição do livro Alimentos Regionais Brasileiros, do Ministério da Saúde, com produtos que têm sido deixados de lado pela população na hora de escolher o que levar para comer. A conclusão é do estudo “Disponibilidade domiciliar de alimentos regionais no Brasil: distribuição e evolução 2002 a 2018″. O levantamento, publicado no mês de julho, é de autoria de pesquisadores Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo.
Os dados analisados são das Pesquisas de Orçamentos Familiares de 2002-2003, 2008-2009 e 2017-2018, coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os indicadores apontam que a participação desses alimentos na dieta dos brasileiros e brasileiras representava 3,69% do total de calorias consumidas em 2002. Esse índice, que já era considerado baixo, caiu para 3,12% em 2008 e se manteve assim na última edição do levantamento, que contempla os anos de 2017 e 2018.
Estagnação
Apesar da queda em relação a 2002, o pesquisador Marcos Anderson Lucas da Silva, um dos autores do artigo, considera que a estagnação do consumo pode ser vista de uma forma positiva.
“Isso pode ter acontecido por diversos fatores. Pode ser por conta da implementação de políticas como o Guia Alimentar para a População Brasileira, o livro de alimentos regionais, que é um documento do Ministério da Saúde e tem receitas, que explica mais sobre esses alimentos também”, destaca.
O grupo de leguminosas foi o que apresentou a maior queda no consumo, de 32,57%. Fazem parte dele o feijão, o grão de bico e a lentilha, por exemplo. Por outro lado, houve aumento no consumo de frutas e também das farinhas regionais. O consumo do alimento derivado da mandioca cresceu 91,66%.
Silva, que é doutorando em Nutrição em Saúde Pública, aponta que o aumento no consumo da farinha usada no preparo da tapioca, especialmente, pode estar associado à discussão sobre alimentação saudável, uma vez que o alimento virou tendência no mundo fitness.
“Isso foi por conta da repercussão de que a farinha de tapioca é mais saudável, envolvendo a discussão de alimentação saudável, fit. Então, é muito importante entender o contexto em que você está inserido para entender o que é esse alimento regional, como ele faz parte dessa dieta pra você”, explica.
O pesquisador acrescenta que o alimento regional vai muito além dos nutrientes oferecidos. Eles carregam memória, afetividade e a identidade de um povo.
“É muito importante destacar essa cultura alimentar. O alimento não é apenas um aglomerado de nutrientes, envolve várias outras coisas no consumo. A gente tem aquela coisa mais afetiva também em relação ao alimento. Então, quando a gente come, não reativa apenas, não nutre a gente com nutrientes, também é pra nossa cabeça, reconforta, faz bem pra gente”, argumenta.
O agricultor Sebastião Alves, que produz alimentos de base agroecológica no Sertão pernambucano, concorda com a afirmação de Silva. Morador da comunidade de Lagoa Grande, no município de Ouricuri, ele ressalta que a comercialização dos produtos nas feiras, por exemplo, “é uma troca de saberes e sabores.”
“As feiras agroecológicas são importantes porque são mais do que um espaço de comercialização. Elas são também um espaço de formação e de aproximação do consumidor com as famílias que produzem o alimento. Além dessa troca de saberes e de sabores”, reforça o agricultor, que destaca a produção diversidade produtiva do Semiárido.
“No Semiárido e no Nordeste tem uma diversidade de alimentos, e a gente coloca nos espaços de comercialização. As frutas, as hortaliças. Tem mandioca, que no Nordeste a gente chama de macaxeira; a galinha de capoeira; ovo; a acerola; o mamão; a goiaba; a graviola. Uma diversidade de alimentos. E são alimentos de qualidade. Alimentos de base agroecológica”, salienta.
Pressão da indústria de ultraprocessados
Ainda sem dados em mãos, o pesquisador Marcos Anderson Lucas da Silva diz que é difícil projetar o cenário atual do consumo de alimentos regionais no Brasil. Mas ele arrisca duas hipóteses: a primeira, que é a boa, é de que a população está mais bem informada sobre os malefícios dos alimentos ultraprocessados e, por isso, na hora da compra, optam por levar para casa os in natura. A hipótese ruim se relaciona ao empobrecimento da população, à disponibilidade e à publicidade massiva dos alimentos industrializados.
“Os estudos sempre mostram o aumento na aquisição de alimentos ultraprocessados. As pessoas realmente estão trocando esses alimentos por ultraprocessados, por serem mais baratos, por tá mais disponíveis nos locais de compra: supermercados, por exemplo, que é onde as pessoas mais adquirem alimentos atualmente aqui no Brasil.
Para Sebastião Alves, a concorrência é desleal, uma vez que a indústria dos ultraprocessados têm a seu favor o capital e toda a estrutura midiática para veicular suas propagandas.
“A gente sempre dialoga nesse sentido. Que a gente precisa da visibilidade do nosso trabalho, nos espaços em que a gente tem a possibilidade de estar dialogando, mas, por trás disso, tem alguém tentando desconstruir. É muito complicado, mas a gente continua. A gente tem esperança de que dias melhores virão”, projeta o agricultor familiar.
Renda para o pequeno produtor
Além de serem mais saudáveis e recomendados pelo Ministério da Saúde, os alimentos in natura também são uma importante fonte de renda para os pequenos produtores. Políticas públicas como o Programa de Nacional da Alimentação Escolar (PNAE) são destacadas pelo pesquisador como um instrumento importante de incentivo ao consumo de alimentos saudáveis e que vai ao encontro da geração de renda.
“O PNAE é uma política muito importante no consumo desses alimentos para as pessoas ou para os jovens e crianças também. Porque, querendo ou não, quando eles estão na escola, introduzem esse tipo de alimento na alimentação deles e quando chegam em casa eles conhecem esses alimentos. Então, isso facilita também na mudança de hábitos alimentares da própria família, quando a criança já está adaptada a consumir aquele tipo de alimento”, reforça.
Outra política mencionada pelo pesquisador para incentivar a alimentação saudável é a rotulagem frontal dos alimentos ultraprocessados, que vão destacar o excesso de açúcar, sal e gordura. Além disso, Silva defende que os supermercados, local onde a população mais compra alimentos, façam promoções e promovam iniciativas para impulsionar a venda desses produtos.
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