26 de julho de 2018
A Via Campesina, que aglutina 15 organizações do campo, denuncia por meio de Nota o Golpe que atinge as Sementes Crioulas no Brasil. O Documento divulgado nesta quinta-feira, 26 de julho, denuncia a ilegalidade do parecer jurídico assinado pelo Procurador da CONAB, advogado Ricardo Augusto de Oliveira, o qual proíbe e impede que sementes crioulas sejam utilizadas no Programa de Aquisição de Alimentos, Programa do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.
Para o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), movimento que integra a Via Campesina, “o parecer jurídico irá afetar não só os camponeses e camponesas, mas também, de forma direta a construção da Soberania Alimentar e Nacional, assim como a reprodução, multiplicação e comercialização das Sementes Crioulas, o que irá aumentar ainda mais a Fome no país”.
Confira nota na integra:
O Golpe Atinge as Sementes Crioulas
As sementes crioulas são a base da segurança alimentar das famílias pobres do campo e o ponto de partida para a produção de alimentos saudáveis. Eram utilizadas normalmente no Programa de Aquisição de Alimentos – PAA Sementes – desde o início deste Programa.
Porém, um parecer pseudojurídico de um procurador da CONAB está extinguindo esta possibilidade.
O parecer jurídico, inconsistente e ilegal, é assinado pelo Procurador da CONAB, advogado Ricardo Augusto de Oliveira, proíbe e impede que sementes crioulas sejam utilizadas no Programa de Aquisição de Alimentos, Programa do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.
O Programa é executado em conjunto pelo MDSA e CONAB desde o ano de 2004.
Com isto, muitas toneladas de sementes produzidas se transformarão em grão para consumo e milhares de famílias pobres do campo, entre elas indígenas e quilombolas, ficarão sem sementes para produzir sua subsistência. Mais um rosto da fome se expressando no campo: impedir de plantar o que comer.
Os argumentos jurídicos do procurador são improcedentes e falsos, como parece estar se tornando moda entre os juristas alinhados ao golpe perpetrado no Brasil em 2016.
Argumenta o dito jurista que as sementes crioulas precisam registro no RENASEM (Registro Nacional de Sementes e Mudas). Ora, mas a Lei de Sementes dispensa este Registro para as Sementes/Cultivares de Variedades Crioulas, como se pode ver:
Diz a LEI No 10.711, DE 5 DE AGOSTO DE 2003, conhecida com Lei das Sementes, em seu Art. 2o , inciso XVI:
“Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
XVI – cultivar local, tradicional ou crioula: variedade desenvolvida, adaptada ou produzida por agricultores familiares, assentados da reforma agrária ou indígenas, com características fenotípicas bem determinadas e reconhecidas pelas respectivas comunidades e que, a critério do Mapa, considerados também os descritores socioculturais e ambientais, não se caracterizem como substancialmente semelhantes às cultivares comerciais;”
E, na mesma Lei, no artigo 8º:
Art. 8o As pessoas físicas e jurídicas que exerçam as atividades de produção, beneficiamento, embalagem, armazenamento, análise, comércio, importação e exportação de sementes e mudas ficam obrigadas à inscrição no Renasem.”
Porém, em seu§ 3o assim se expressa a Lei:
“§ 3oFicam isentos da inscrição no Renasemos agricultores familiares, os assentados da reforma agrária e os indígenas que multipliquem sementes ou mudas para distribuição, troca ou comercialização entre si.”
Conclusão meridianamente clara: não pode o Estado e nenhum de seus agentes exigir o que a Lei dispensa. Como gostam de dizer, não estão acima da Lei.
Agarra-se, porém, o Procurador Dr. Ricardo também em outro item: a CONAB entra no processo entre os agricultores familiares produtores de sementes e os agricultores familiares beneficiados pelo PAA Sementes como “COMERCIALIZADORA,” o que seria vetado pela Lei das Sementes.
Outro equívoco abissal do Procurador. A CONAB participa do programa como MEDIADORA e EXECUTORA de Programa Social visando cumprir preceito Constitucional de ERRADICAR A POBREZA EXTREMA.
Apega-se o tal Procurador no fato de que a CONAB “emite nota”, o que convalidaria “comercialização”, ato ilegal em seu parecer.
Ora, o fato de “emitir nota” não caracteriza, em si,“ato comercial”, mas apenas uma formalidade necessária aos procedimentos legais como transporte, remuneração da entidade fornecedora, quantificação, entre outros.
O Ato Originário, programa ministerial PAA visando minimizar situações de carência, não é comercial, sequer empresarial e a participação da CONAB, em si, não tem o condão de mudar o ato originário, a não ser na aparência e na mera formalidade, formalidade esta, em parte mínima do processo. O procedimento mediador viabiliza o processo todo, fazendo com que a Semente Crioula saia das unidades de produção de agricultores familiares e chegue até os beneficiários finais do Programa Social, agricultores familiares em situação de vulnerabilidade social e alimentar.
Ressalte-se: a CONAB é remunerada para executar este Programa e o salário de seus servidores são pagos pelo Governo, razão porque a CONAB em si, não usufrui de nenhum lucro ou dividendo direto das sementes, o que descaracteriza qualquer veleidade de “ato comercial” e reafirma o caráter meramente MEDIADOR de sua ação.
Consta ainda entre os objetivos da CONAB em seus Estatutos, aparentemente, esquecidos pelo Procurador Dr. Ricardo:
“Suprir carências alimentares em áreas desassistidas ou não suficientemente atendidas pela iniciativa privada;
“Participar dos programas sociais do Governo Federal que guardem conformidade com as suas competências;”
Porém, o objetivo real é extinguir o PAA – Sementes e os argumentos de aparência legal são apenas o meio. Este Governo serve aos grandes proprietários rurais e às multinacionais das sementes que querem extinguir o controle popular da biodiversidade agrícola.
E assim, com aparência de legalidade, O GOLPE ATINGIU AS SEMENTES CRIOULAS E QUEM AS PRODUZ E UTILIZA.
Um dos efeitos imediatos, é o aumento da fome entre as famílias camponesas, indígenas e quilombolas.
O outro, tão grave quanto este, é a diminuição da oferta de alimentos saudáveis a toda a sociedade brasileira.
Via Campesina – Brasil, 26 de julho de 2018.
Por Comunicação MPA
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