7 de fevereiro de 2022
Fernanda Couzemenco
Século Diário | Vitória (ES)
A certificação orgânica das famílias camponesas do Espírito Santo dá um passo importante nesse início de 2022, por meio de um trabalho pioneiro que visa expandir as possibilidades de comercialização dos produtos agroecológicos atualmente restritos à venda direta.
Em reunião realizada nessa sexta-feira (4) com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), agricultores agroecológicos de São Gabriel da Palha, no noroeste do Estado, beneficiadas pelo projeto “Promoção da soberania alimentar de famílias de pequenos agricultores do Estado do Espírito Santo através de métodos de agroecologia, certificação orgânica, marketing e advocacia”, iniciaram o processo de adequação de unidades produtivas, necessário à certificação.
O projeto é desenvolvido pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no norte e noroeste do Espírito Santo, por meio da Associação dos Pequenos Agricultores do Estado do Espírito Santo (Apagees), com apoio da organização alemã Welthaus Bielefeld. A reunião aconteceu na sede da Cooperativa Camponesa (São Gabriel da Palha), que é parceira da Rede Bem Viver do MPA.
A atuação do Sebrae integra o programa SebraeTec, que fornece subsídio aos agricultores no acesso à consultoria para a certificação orgânica auditada e que, mais recentemente, passou a disponibilizar também subsídio de consultoria especializada para o procedimento de adequação da unidade de produção às exigências da certificação, seja a de auditoria, seja a participativa.
“As famílias que iniciaram esse processo de certificação auditada também estarão na certificação participativa”, salienta Dorizete Cosme, membro da coordenação estadual do MPA no Espírito Santo.
O duplo reconhecimento decorre do fato de que as famílias integrantes da Rede Bem Viver/MPA atendidas na iniciativa com o Sebrae também trabalham, em paralelo, na construção de uma entidade camponesa que tende a ser o primeiro Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (Opac) capixaba.
Esse tipo de entidade, já existente em outros estados do Brasil, principalmente na região sul, é a única, segundo a legislação brasileira, capaz de fornecer certificação orgânica por meio de processo participativo, dentro do Sistema Participativo de Garantia (SPG).
No Espírito Santo, a venda indireta hoje é certificada apenas por auditoria, dentro do Sistema Brasileiro de Avaliação de Conformidade Orgânica (SisOrg), um processo mais caro e inacessível para algumas famílias. Sem essa certificação, a venda dos produtos orgânicos só é permitida de forma direta ao consumidor, em feiras e entregas em domicílio, a partir de uma declaração do Ministério da Agricultura (Mapa) que reconhece o trabalho orgânico feito por um grupo de agricultores organizados por meio de um Organismo de Controle Social (OCS).
Há vários OCSs no Estado e os pontos de venda direta se multiplicaram nos últimos anos, para benefício dos agricultores e dos consumidores, que podem acessar um produto saudável e com preço justo.
“Ainda não dá para ‘fugir’ da auditada”, ironiza o líder camponês, ressaltando que “a atenção maior [do MPA e da Rede Bem Viver] é pela certificação participativa”. A afinidade maior com a certificação participativa se deve ao seu caráter mais “democrático” e de maior “empoderamento das famílias”, acrescenta.
O contexto mercadológico atual, explica, exige adaptação ao processo auditado, para que produtos consolidados da agricultura e agroindústria camponesa –café, pimenta-do-reino, cachaça, cacau – possam ser comercializados em escala nacional e internacional.
Enquanto a Opac é criada, as famílias conduzem o avanço da agroecologia expandindo suas possibilidades de comercialização, já estando prontas para quando o sistema participativo brasileiro tiver reconhecimento de novos países no continente americano e para além dele.
Douglas Alvaristo, articulador da Rede Bem Viver, acentua que as iniciativas empreendidas pelo povo camponês e outros movimentos sociais, no território capixaba e de outros estados, são basicamente os únicos programas voltados a enfrentar “o contexto de empobrecimento das populações rurais desde o ano de 2016”. O caminho para agroecologia, afirma, “é coletivo, de cooperação e ajuda mútua”.
Para Clóvis Conte, assessorado pelo projeto, a ação lançada nessa sexta-feira “marca a história, reflete em uma ação, anos de trabalho e luta pela afirmação camponesa, que vem num primeiro momento como uma denúncia ao sistema de produção convencional e, num segundo momento, como uma ação afirmativa”.
Ação afirmativa que está intimamente alinhada com os conceitos e práticas identificadas com a Agroecologia, que conectam os agricultores familiares despertos para a necessidade de romper as amarras aos ciclos viciosos e degradantes do agronegócio e realizar a transição agroecológica.
“Ser camponês é um modo de viver no campo, trabalhar no campo, e se relacionar com a natureza de uma forma mais harmoniosa possível e sempre preservando os costumes da culinária e da cultura local, e num contexto de trabalho familiar”, pondera Dorizete Cosme. Originalmente, o campesinato é agroecológico, assim como toda agricultura familiar.
A Revolução Verde, a partir da década de 1960, recorda Dorizete, “seduziu” muitas famílias, que se viam ainda amarradas a regras bancárias e orçamentos públicos cada vez mais comprometidos com o grande latifúndio e sua sede de venenos. Após duas décadas de expansão sem freio do uso de defensivos agrícolas, polos de resistência e produção de um conhecimento novo foram surgindo, ancorados nas tradições ecológicas do mundo pré-Revolução Verde e modernizado pelas descobertas científicas em múltiplas disciplinas do saber.
O futuro é agroecológico. Quanto antes incorporar-se a ele, mais rápido serão alcançadas as benesses de uma economia e uma vida livre de venenos e nutrida por amor, verdade, respeito e prosperidade.
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