Evento realizado pelo MPA já se tornou uma referência para segmento adepto da agroecologia
Texto: Brigada de Comunicação Popular nén ũ toy fã
Fotos: Leandro Molina e Luz Angela
Contrariando a previsão do tempo – que prometia céu cizudo e chuva no horário mais intenso da festa – o Sol foi o convidado especial no sábado, 2, quando cerca de 500 pessoas vindas de diferentes lugares confraternizaram as sementes crioulas e reforçaram o ideal da agroecologia na Linha Tesoura, interior do município de Seberi (RS). Ao som de músicas tradicionais a palavra “partilha” teve seu significado reforçado por homens, mulheres e crianças que irmanaram-se trocando suas sementes, dividindo momentos de conversa, sentando à mesma mesa para desfrutar do cardápio típico e, destaque-se, tendo a oportunidade de efetivamente um segurar a mão do outro para declarar a posição de resistência que o segmento camponês mantém frente à conjuntura política atual.
Realizada pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), com a Participação da Cooperbio, a festa a cano ano reafirma o objetivo de “lembrar a importância da soberania alimentar e promover a recuperação da diversidade das sementes, a afirmação da alimentação saudável e a valorização do cuidado com o meio ambiente”, conforme afirmou Maria Cazé, integrante da direção nacional do MPA, que veio do Piauí especialmente para participar do evento. Para ela, apesar das dificuldades que o campesinato enfrenta historicamente, a militância do MPA mostrará que está mais uma vez pronta a dar sua contribuição na história para construir um país mais justo, com igualdade e soberania.
Frei Sérgio Görgen afirmou que o campesinato brasileiro tem três grandes desafios em seu norte próximo: organizar o povo na defesa dos seus direitos; firmar um projeto voltado à produção de comida saudável e recuperar a democracia no país. “Hoje estamos reunidos num momento festivo, de celebração, de congraçamento, mas também é momento de relembrarmos nossa história, nossas lutas e nossas conquistas. Sabemos das dificuldades do presente, mas não vamos perder a visão do futuro, a visão do nosso projeto histórico, da nossa utopia, daquilo porque nós lutamos”, afirmou. Relembrando as lutas empreendidas pelas gerações passadas, Görgen relembrou a todos que a história não termina nesta geração e que é preciso também plantar e lutar pelas gerações futuras.
Delegações de todas as regionais do MPA no RS, oeste catarinense e ainda representantes do Paraná, Rio de Janeiro, Piauí e Pernambuco estiveram presentes, trazendo produtos agroecológicos, sementes crioulas e saberes a compartilhar com camponeses e camponesas da localidade e região, bem como com os moradores urbanos de Seberi e das cidades vizinhas que estiveram presentes. Entre as autoridades, pronunciaram-se reconhecendo a importância do segmento camponês o deputado estadual Edegar Pretto e o prefeito municipal Cleiton Bonadiman.
Encontro de culturas e sabores
O mosaico multicolorido de referências culturais composto ao longo do dia contou ainda com a feira agroecológica, celebração ecumênica e uma grande variedade de apresentações culturais. As falas dos dirigentes do movimento, assim como de agentes políticos presentes, centraram-se no norte temático do evento que propunha a reflexão sobre a importância da produção agroecológica e a necessidade de se firmar um modo de produção que liberte a agricultura da dependência dos venenos, dos insumos químicos e da manipulação genética.
Valdemir Olegário de Melo, produtor de frutas quem mora em Mampituba, no litoral norte do RS, veio com seus companheiros e companheiras participar da festa e aproveitou para trazer uvas e maracujás, entre outras variedades de hortifrutigranjeiros. Para o camponês o evento oportuniza o intercâmbio de saberes, a troca de experiências entre pessoas de diferentes localidades como um elo de fortalecimento da tradição camponesa, que se fundamenta na coletividade.
Em volta da mesa, no almoço, o aroma do alimento preparado com carinho e a certeza de um cardápio formulado somente com produtos agroecológicos: galinha caipira, porco no tacho, polenta, arroz, mandioca e batata doce, com sucos naturais, cerveja artesanal e água para continuar com a jornada. Camponês de Vicente Dutra, Ibanez Gonçalves, afirmava com orgulho a tradição de todo ano participar da festa: “Quando chega fevereiro e a Festa da Semente vai se aproximando, a gente tem esse incentivo a mais para não esquecer a importância da cultura do interior e unir forças para mostrar que o campesinato ainda tem muito a oferecer.
Trocando sementes e saberes
Irene Reis da Silva, vizinha da Cooperativa, relembra os costumes que passam de geração em geração: “Quando chega a tarde e começa a troca de sementes e mudas, é reafirmada a tradição de nossos pais e avós, é a vida que se renova na partilha, o nosso sentido de ser”. Dos que vieram de longe, a pernambucana Joselita Tavares, responsável pela secretaria da Via Campesina no Brasil, e pela primeira vez participou da Festa da Semente, mostrava-se surpresa positivamente: “É uma grande oportunidade, encontrei aqui muito companheirismo, muita alegria e muita energia positiva para animar nossa luta nesse momento difícil que estamos passando. E quanto às variedades de sementes, é sempre uma nova descoberta, em um evento assim sempre descobrimos novidades na diversidade, levando mais experiência e conhecimento de volta para nossas bases”.
Em meio à muita música, dança e congraçamento, o presidente da Cooperbio marcos Joni de Oliveira agradeceu a todos que de uma forma ou outra contribuíram para a realização da festa, sejam empresas, instituições, cooperativas, militantes da base do MPA e principalmente os voluntários e voluntárias que ajudaram a construir o festejo popular com sucesso, superando os objetivos iniciais projetados. Desde já fica confirmada a realização da VI Festa da Semente Crioula em 2020.