29 de junho de 2022
Marcelo Menna Barreto
Extra Classe | Rio de Janeiro (RJ)
O Projeto de Lei que estabelece o autocontrole dos produtores rurais sobre sua própria produção avança rapidamente no Senado Federal (PL 1.293/2021). Na última quinta-feira, 23, a bancada ruralista aprovou o PL na Comissão de Agricultura por nove votos a dois.
Caso não haja recurso para votação em plenário, a PL seguirá para sanção.
Pequenos agricultores, fiscais agropecuários, ambientalistas e entidades de defesa animal criticam.
Janus Pablo, presidente da Anffa Sindical, sindicato que representa os auditores fiscais federais agropecuários, defende o tramite do PL ainda em comissões como a de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor, além da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
“A sociedade precisa ser envolvida nesse debate, que sequer existiu nesse curto período de tramitação do projeto”, justifica.
Ele lembra nota recente lançada pela entidade, que chegou a realizar uma “greve de alerta” nos dias 14 e 15 de junho, para chamar a atenção sobre o tema que diz tem forte impacto sobre a saúde pública.
“A proposta impede o registro automático de agrotóxicos, mas desconsidera produtos que têm na composição princípios ativos idênticos aos agrotóxicos, como acontece com produtos da classe dos antiparasitários de uso veterinário, aplicados tanto em animais produtores de alimentos”, denuncia o documento da Anffa Sindical.
Na nota, também destacam: “Grave também é o registro automático de drogas antimicrobianas sem análise prévia de auditores fiscais federais agropecuários, cujos resíduos em alimentos de origem animal podem causar resistência microbiana a antibióticos no consumidor e desenvolvimento de superbactérias”.
Para Marciano Silva, engenheiro agrônomo e integrante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), esse PL é um disparate.
“Não é o primeiro de uma série de tentativas, entre aspas, de desburocratização e de desresponsabilização do estado nacional, estados e municípios que devem se encarregar da vigilância sanitária”.
Ele, ironicamente, se diz surpreso com essa proposta. “Na maioria das vezes o argumento do agronegócio é evitar gerar mais uma despesa para o seu sistema produtivo”, registra.
Silva aponta a contradição de se manter a situação como está para os produtos de exportação.
Lembra também que o PL diz que a vigilância estatal vai continuar atuando para atender as exigências internacionais para a exportação e deixar os consumidores internos nas mãos daqueles que deverão se autofiscalizar.
Carla Lettieri, diretora executiva da Animal Equality no Brasil registra em manifestação pública que “é imoral aprovar um projeto que visa transferir do poder público para as próprias empresas a responsabilidade de supervisionar o cumprimento das normas sanitárias e de bem-estar animal”.
Organização internacional que se dedica a trabalhar com a sociedade, governos e empresas para acabar com a crueldade com os animais de produção, a Animal Equality iniciou na semana passada uma campanha para pressionar o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD/MG) para que amplie a discussão da matéria aprovada na Comissão da Agricultura
“A agroindústria sendo amplamente beneficiada, enquanto bilhões de animais ficarão vulneráveis aos piores tipos de abusos e o consumidor será prejudicado. Em casos mais sérios, pessoas poderão ter graves complicações de saúde por causa da falta de fiscalização dos alimentos de origem animal”, diz a ONG.
Janus Pablo diz que a Anffa Sindical já está em contato com senadores contrários ao PL para que entrem com recurso para sua discussão no plenário.
Para o presidente do sindicato, a PL é uma porta aberta para a terceirização da atividade que deve ser pública. “Somos os últimos guardiões do consumidor brasileiro. Se abruptamente formos retirados de uma planta frigorífica, por exemplo, isso deixa o consumidor muito indefeso. Precisaríamos de no mínimo uma década de transição para chegar a esse modelo”, explica.
Os dois votos vencidos na Comissão da Agricultura foram dos senadores Paulo Rocha (PT/PA) e Zenaide Maia (PROS/RN). Segundo a parlamentar potiguar, se o governo reconhece que não tem pernas para fiscalizar, deveria aumentar a capacidade técnica dos órgãos de fiscalização e controle.
“Não precisa passar essa competência para o agronegócio. Vamos melhorar a fiscalização e controle, aumentando a capacidade técnica desses órgãos”, argumentou.
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