24 de fevereiro de 2022
Redação – SAS/VPAAPS
FIOCRUZ | BRASIL
“É um reconforto, um apoio, uma grande ajuda e dá esperança de que um mundo melhor virá.” É assim que uma moradora da estrada do Fincão, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, descreve o significado da cesta básica que recebeu nos últimos meses. Ela e a família, que é composta também pelo marido, dois filhos e cinco netos, viram a renda reduzir de forma drástica na pandemia, já que os serviços de jardinagem prestados praticamente não têm sido solicitados.
“Tenho crianças e elas pedem coisas que a gente nem tem condições de comprar. Às vezes, nem temos pão e criança não espera, né? Vai fazer um ano que estou desempregada dos bicos que fazia, e de trabalho mesmo, uns cinco anos.”, afirma outra mãe da comunidade Viana do Castelo, também na Zona Oeste.
Os relatos ouvidos pela equipe da Fiocruz Mata Atlântica (FMA) se multiplicam Brasil afora, confirmados por dados que denunciam a extensão do desemprego e da insegurança alimentar que afetam duramente milhões de brasileiros e esvaziam, cada vez mais, geladeiras e pratos. Diante da situação de vulnerabilidade social e alimentar em Jacarepaguá, o Coletivo de Trabalhadores da FMA iniciou em abril de 2020 uma Ação Solidária no Setor 1 da Colônia Juliano Moreira.
Flávia Passos Soares, da equipe social do Núcleo de Convívio da FMA, avalia que o estabelecimento de parcerias foi fundamental para manter a ação viva ao longo do tempo, arrecadando doações para 90 famílias entre o total de 250 no território. “Muitos nunca tinham vivenciado a situação de não ter como suprir as necessidades, passando por grande sofrimento e constrangimento. Quando não precisavam mais da cesta, por conseguirem alguma renda, informavam à equipe para não tirar a oportunidade de outras famílias que passaram a precisar por perda do emprego, renda insuficiente ou problemas de saúde”, relata.
A psicóloga conta que, nos últimos três meses, a continuidade da iniciativa foi possibilitada por uma cooperação selada com o Greenpeace e intermediada pela Agenda de Saúde e Agroecologia da VPAAPS. No dia 26 de janeiro, a remessa final de um total de 270 cestas da campanha “Agroecologia Contra a Fome” foi entregue às comunidades, garantindo alimentos saudáveis, sem agrotóxicos e produzidos por agricultoras e agricultores familiares que compõem o MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores.
Foram diversos os percursos para que os alimentos cultivados por mãos camponesas chegassem às mesas das famílias: o arroz Velho Chico branco e integral veio de famílias que vivem às margens do Rio São Francisco, em Sergipe; os feijões preto e vermelho, canjiquinha e fubá foram produzidos em Duas Barras, no interior do RJ; o feijão carioquinha e a farinha de mandioca foram de famílias camponesas do sudoeste da Bahia e os cafés do Campesinato e Cooperbac do mesmo estado; e o açúcar demerara foi produzido pela Cooperafloresta, cooperativa formada por famílias quilombolas no Vale do Ribeira (SP).
Se por um lado as cestas contribuíram para o acesso a comida de verdade, rica nutricionalmente, por outro também foram garantia de renda para agricultoras e agricultores impactados pela pandemia, como explica Cristina Flores, da coordenação estadual do MPA no RJ.
“As políticas públicas para a Agricultura Familiar Camponesa têm sido menosprezadas nos últimos anos, como quando Bolsonaro vetou a ação emergencial aos pequenos agricultores, privilegiando o agronegócio. Por isso, neste ano o MPA e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) lançaram um pedido de socorro. Até agora, nada foi feito, seja em nível estadual, seja em nível federal. Por tudo isso, iniciativas como esta são fundamentais para ajudar a escoar a produção das famílias camponesas, garantindo que permaneçam no campo produzindo alimentos saudáveis.”, analisa Cristina.
Marina Lacôrte, da campanha de agricultura e alimentação do Greenpeace, destaca que, para além das ações emergenciais, é urgente se repensar o modelo produtivo brasileiro: “A pandemia escancarou a verdade inconveniente que cientistas e sociedade civil já vêm mostrando há anos, de que o atual sistema alimentar é insustentável. Além da dependência dos agrotóxicos, o agronegócio brasileiro, que se apoia na exportação de commodities, é um dos principais motores da destruição ambiental e das mudanças climáticas no mundo. Aqui, a expansão agropecuária segue sendo a maior responsável pelo desmatamento e destruição da biodiversidade, atropelando os direitos básicos a uma alimentação saudável e ao meio ambiente equilibrado”.
“A agricultura monocultora de commodities, que domina a maior parte das nossas paisagens agrícolas atualmente, não tem dado conta do desafio da fome, nem dentro nem fora do Brasil. O cenário nos diz isto quando vemos recordes atrás de recordes das safras e exportações, ao mesmo tempo em que vemos pessoas enfrentando filas para conseguir restos de alimentos e ossos e em que assistimos, em números, ao Brasil voltar ao mapa da fome”, Marina Lacôrte.
Lacôrte sustenta que a agroecologia é uma ciência consolidada com crescente produção acadêmica no mundo todo, reconhecida inclusive pela ONU como chave para solucionar a questão da fome e como caminho indispensável na redução das desigualdades sociais, na promoção da saúde coletiva e na proteção do meio ambiente. Por isso, o Greenpeace defende a agroecologia como uma solução transversal e pluridisciplinar, um projeto de transformação social amplo, capaz de solucionar as múltiplas e graves crises que temos enfrentado no Brasil e no mundo.
“Embora seja preciso ampliar muito o apoio à produção agroecológica, já existem centenas de iniciativas que, mesmo com pouco suporte, apresentam resultados incríveis na melhoria da produção e da produtividade de alimentos saudáveis e, ao mesmo tempo, vêm gerando empregos e recuperação ambiental”, destaca.
Robson Patrocinio de Souza, coordenador do programa de soberania e segurança alimentar e nutricional e economia solidária da FMA, avalia que, além de contribuir para minimizar a fome das famílias, a ação de solidariedade teve uma importância muito grande na articulação das instituições, tanto internamente na Fiocruz, com a Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) e entre as equipes da Mata Atlântica, quanto externamente, no diálogo com Greenpeace e MPA.
“Diante das questões brutais que estão acontecendo, a fome, o aumento da pobreza, uma das saídas é a articulação em rede. Eu não vejo outra forma que não seja coletiva, pensada estrategicamente para fortalecer a agricultura familiar e a agroecologia”, reflete.
Robson também pontua que, mesmo com o desemprego, as famílias que constroem a agricultura urbana têm maiores condições de acesso a uma alimentação adequada: “Ter um quintal, ter uma produção, contribui demais para o sustento da família”, pondera.
No mesmo sentido apontado por Robson, Natália Almeida afirma que a promoção da alimentação saudável explicita um dos compromissos da Agenda de Saúde e Agroecologia da VPAAPS: “Em situações emergenciais, é imprescindível que os alimentos cheguem até as comunidades o quanto antes. Ao mesmo tempo, essa urgência também sinaliza que diversas organizações da agricultura camponesa, redes de agroecologia e comunidades tradicionais já estão prontas para serem parceiras na promoção de saúde, a partir da oferta de alimentos não apenas livres de agrotóxicos mas também de injustiças sociais. Essas experiências demonstram a capacidade dos abastecimentos agroecológicos acontecerem de forma mais permanente e estruturada nos territórios, muito além da entrega temporária das cestas.”, afirma Almeida, relembrando o conjunto de ações promovidas pela Fiocruz em diversos territórios no Brasil.
Desde 2011, a FMA fomenta a agroecologia na Colônia Juliano Moreira, por meio do projeto de Quintais Produtivos, e a expectativa é que cerca de 30 novas famílias sejam envolvidas no Projeto Ará, que busca fortalecer os territórios na promoção da saúde e do desenvolvimento sustentável, diante dos desafios impostos pela pandemia da Covid-19.
Ao longo de toda a ação solidária, o Coletivo de Trabalhadores da FMA reforçou a importância do distanciamento social, do uso da máscara para a proteção de todas e todos, e da vacinação, dialogando para reduzir a desinformação com informação qualificada.
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