25 de novembro de 2021
Mateus Moises*
MPA Pará | Santo Antônio do Tauá
Em 2019, por conta de um acidente trágico e inesperado, o companheiro Raimundo Manoel, conhecido com ‘Pipoca’, partiu fisicamente, deixando plantado em nossas mentes e corações a prática militante de uma vida inteira na luta pela terra.
Uma trajetória marcada por nunca ter hesitado em ocupar o latifúndio, em denunciar a grilagem de terras, impedir o desmatamento em terras públicas, construir jornadas de lutas, mobilizações, realizar troca de sementes, fazer forno de barro, vender sua famosa garapa e sempre dedicar um momento especial de brincadeiras com crianças nas atividades do MPA.
Seu legado está presente nas árvores e plantas que eram cultivadas em seu lote e o igarapé, onde estava construindo sua roda d’água. Como bom e experiente camponês da Amazônia, Raimundo estava sempre superando as dificuldades com criatividade e organização.
No final de 2020, realizando o trabalho de base em Santo Antônio do Tauá, município em que residia o Pipoca, o MPA começou a atuar na organização de uma ocupação em uma fazenda na travessa João Coelho. Naqueles momentos enfrentávamos, ainda, um avanço da pandemia do corona vírus e já ansiávamos pelo início da vacinação.
Esta área segue ocupada e irá completar um ano de resistência no próximo dia 27 de novembro. Recebeu o nome de “Raimundo Manoel” como homenagem e como símbolo de luta para as próximas gerações camponesas. Este processo de resistência e enfrentamento é pedagógico, formativo e pratico em diversas dimensões da organização e construção do Poder Popular e do Plano Camponês com as seis soberanias.
“O projeto Popular para a agricultura tem como um de seus pilares a distribuição de terras para os filhos de pequenos agricultores e para os que não tem terra suficiente para sustentar sua família. O Brasil precisa com urgência de uma reforma agraria profunda, rápida e radical.” (GORGEN, Frei Sergio. Candiota, RS, 2019).
Estamos lutando e aprendendo a lutar juntos, a luta é diária e contínua. A luta tem diferentes dimensões e precisamos estar no campo, resistindo, na luta pela terra pegando no arado da reforma agraria, todos os campos da luta devemos ocupar com a militância.
A luta se faz na terra ocupada, a luta se faz semeando valores militantes em cada pessoa que chega, a luta se faz garantindo acesso à educação para jovens e crianças, a luta se faz enfrentando as dificuldades da fome, enfrentado a falta de energia elétrica, o difícil acesso a água potável, a luta se faz constantemente aprendendo que viver sem lutar é um erro.
A luta pela terra se faz com muita solidariedade e humanidade e esses valores são praticados em cada mutirão para construção de casas, limpezas de ramais, trocas de sementes, mutirões de produção, compartilhamento de receitas e ervas medicinais que encontramos no campo e ajudam no momento da enfermidade.
As famílias acampadas na base do MPA, quando organizados, que procuram entender que o problema e dificuldades de acesso à terra são frutos do capitalismo, uma questão de desigualdade de classe, questão essa que nunca mudou desde 1500, quando os portugueses invadiram nossas terras e se disseram donos até os dias atuais no Brasil.
O latifúndio na Amazônia avançou ainda no século XVIII, no período dos projetos de colonização e criação de zona coloniais que visavam a construção de estradas e de imigração Europeia para modernização da agricultura, bem como de gente ambiciosa em explorar os recursos naturais abundantes em nossa região.
Como afirma a professora Marcia Motta: “Não há como negar, ao não partilharmos o território, a nação brasileira do novo milênio tem como herança uma concentração fundiária desumana. Um pais de dimensões continentais capaz de construir uma sociedade onde apenas 1% dos proprietários rurais detém 44% das terras, enquanto 67% deles detém apenas 6% das terras. É difícil pensar na recriação da nação brasileira, sem levar em conta tão tristes números.”
Sabendo que a tão sonhada Reforma Agrária nunca aconteceu, tivemos poucos avanços e que em muitos casos a justiça fica cega diante do poder econômico e interesse de classe. A judiciário brasileiro, historicamente, beneficia os grandes proprietários que conseguem através de manobras jurídicas obter êxito em ações de áreas litigiosas.
Por isso, o MPA entende que é necessário organizar a luta política de acesso aos meios de produção para a construção da soberania alimentar e o poder popular. Entende que a terra é um meio essencial para a produção e reprodução do campesinato enquanto classe, sem a terra estaremos vulneráveis e predestinados a cumprir as profecias teóricas que anunciam o “fim do campesinato”.
A soberania alimentar vem junto ao acesso à Terra, pois teremos condições de decidir plantar nosso alimento e a forma que queremos plantar este alimento, que é de forma Agroecológica. Nosso interesse aqui é trazer alguns elementos importantes que fundamentam nossa experiência concreta na base do Movimento dos Pequenos Agricultores como forma de celebração deste primeiro ano de resistência no Acampamento “Raimundo Manoel” e dizer que ainda estamos longe do fim de escrever uma história social do campesinato na Amazônia, que dê conta das diversas formas que ele se constitui e resisti em cada território.
*Mateus Moisés, militante do MPA e estudante de História, 22 de novembro de 2021.
Referencias:
GORGEN, Frei Sergio Antonio. O plano camponês: Coleção Derli Casali, v. 1, 2019.
MOTTA, Márcia MM. A grilagem como legado (2001). Disponível em: http://www. direito. mppr. mp. br/arquivos/File/Politica_Agraria/7MottaAGrilagemcomoLegado. pdf. Acesso, v. 4, 2017
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