13 de setembro de 2018
Terra de Direitos é uma das entidades admitidas no processo. Estima-se que isenção fiscal deixou de arrecadar cerca de R$ 9 bilhões em oito anos.
Relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que questiona a isenção fiscal dos agrotóxicos no país, o ministro Edson Fachin acolheu o pedido de quatro organizações e redes da sociedade civil para atuar como amicus curiae no processo. Dessa forma, a Terra de Direitos, a Campanha Nacional Permanente Contra os Agrotóxicos, a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e a Fian Brasil poderão fornecer mais elementos para a decisão que ainda será tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O pedido único para ingresso na ADI 5553 foi feito de forma coletiva pelas entidades em março deste ano. Integrante da Campanha Contra os Agrotóxicos e advogada popular da Terra de Direitos, Naiara Bittencourt destaca a importância da participação de organizações e coletivos da sociedade civil neste processo. “A decisão significa uma pequena abertura no sistema de justiça para a intervenção de movimentos e organizações sociais com papel fundamental na vida democrática brasileira, em especial na participação dos processos decisórios do judiciário”, aponta. “Mesmo assim, a reivindicação das organizações de realização de audiência pública no STF sobre o tema, tendo em vista a relevância do assunto, ainda não foi atendida pelo Supremo”,
Outro ponto destacado pela advogada é o fato de a Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e pela Vida – uma articulação da sociedade civil, sem personalidade jurídica – ter sido aceita no processo. Apesar de ser previsto em legislação, são poucos os casos em que entidades sem personalidade jurídica podem ajuda a subsidiar decisões do Judiciário. Na decisão que determinou a admissão da Campanha e das outras três entidades na ADI, Fachin considerou que as organizações são “reconhecidas em foros nacionais e internacionais, bem como aportaram substanciosa manifestação técnica”.
A ADI 5553 foi ajuizada em 2016, pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), para questionar as cláusulas 1ª e 3ª do Convênio nº 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e o Decreto 7.660/2011. Esses dispositivos concedem benefícios fiscais ao mercado de agrotóxicos, com redução de 60% da base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), além da isenção total do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de determinados tipos de agrotóxicos.
Uma decisão em um acórdão publicado pelo Tribunal de Contas da União em abril de 2018 constatou que, entre 2010 e 2017, cerca de R$ 9 bilhões foram renunciados aos cofres públicos. Ao mesmo tempo, apenas em 2016, R$ 30 bilhões foram faturados pela indústria de agrotóxicos, segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Vegetal.
A renúncia vai na contramão da política de austeridade adotada pelo governo de Michel Temer por meio da aprovação da Emenda Constitucional 95, que determina o congelamento de gastos e investimentos públicos nas áreas sociais, e impacta de forma mais acentuada as pessoas mais vulneráveis socioeconomicamente.
Em termos comparativos, esse valor seria suficiente para manter durante cerca de 14 anos o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), um programa federal de incentivo à agricultura familiar. Durante 2010 e 2017, R$ 4,7 bilhões de reais foram investidos no programa que beneficiou mais de 800 mil famílias, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social. Apenas entre 2015 e 2017, mais de 30 milhões de consumidores foram beneficiados pela distribuição de alimentos da agricultura familiar por meio do PAA. Apesar da importância desta política, o corte de gastos resultou na diminuição de R$ 210 milhões no orçamento previsto para 2018.
O valor que deixou de ser arrecadados pelo governo federal por causa da isenção de impostos de agrotóxicos também é 50 vezes maior que o valor destinado para a titulação de territórios quilombolas no Brasil. Com esse dinheiro, também seria suficiente arcar com a manutenção anual do Museu Nacional no Rio de Janeiro durante 18 mil anos. O corte de gastos e a falta de repasses – que deveriam chegar a R$ 500 mil por ano – resultaram no incêndio do museu no dia 2 de setembro.
Além dos prejuízos aos cofres públicos pela falta de arrecadação, as entidades que ingressaram na ADI também alertam que esse incentivo ao uso de venenos agrícolas traz outros gastos ao governo: um estudo publicado na revista Saúde Pública revela que para cada dólar gasto com a compra de agrotóxicos no Paraná, o custo externo em razão de intoxicação gira em torno de U$$ 1,28.
A avaliação para a isenção fiscal de algum produto passa pela análise dos princípios da essencialidade tributária. Esse princípio determina que, quanto maior a importância social do bem, haverá benefícios e incentivos fiscais do Estado. Isto é, se o produto é essencial para a coletividade, deve ter isenções ou reduções tributárias.
Esse é um princípio importante, que serve para reduzir as desigualdades sociais e facilitar o consumo de bens básicos para a reprodução da vida da população. No entanto, a essencialidade dos agrotóxicos para a população é questionada pelas entidades que ingressaram como amicus curiae. “Não se pode considerar como essenciais os produtos que são comprovadamente danosos a saúde humana, ao meio ambiente e à vida. Essenciais são os alimentos saudáveis, não os agrotóxicos”, ressalta Naiara Bittencourt.
As entidades também apontam que os benefícios aos agrotóxicos foram concedidos sem justificativa concreta e sem debate com a sociedade civil. O principal argumento é de que os venenos agrícolas seriam imprescindíveis para a economia nacional. No entanto, ao apresentar manifestação nesta Ação Direta de Inconstitucionalidade, após requerimento do Ministro do STF Relator Edson Fachin, o Ministério da Fazenda não apresentou fundamentos oficiais escritos para a concessão das isenções aos agrotóxicos.
Por Franciele Petry Schramm – Com informações de Naiara Bittencourt e Thales Mendonça | Terra de Direitos
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