14 de novembro de 2024
A Colômbia está realizando uma Reforma Agrária histórica. A COP como cenário de encontro e discussão dos principais eixos que o campesinato discute hoje em todo o mundo: política agrária internacional, agroecologia, circuitos curtos de comercialização e alianças entre produtores e consumidores.
Por Bianca Coleffi
Em 2018, a ONU reconheceu o campesinato como sujeito de direitos, mas a Colômbia só aderiu a ele em 2022 com a chegada do governo de Gustavo Petro. Esse marco internacional serve hoje para avançar na Reforma Agrária que está sendo realizada no país.
Desde 2022, a Colômbia lidera um processo de restituição dos direitos territoriais, culturais, sociais, económicos e simbólicos das famílias indígenas e afrodescendentes de numerosos departamentos da Colômbia profunda, que têm sido historicamente afetados pelo abandono do Estado, pelo extrativismo e pelos conflitos armados.
Anos depois, o país abriu a janela para a possibilidade de uma Reforma Agrária e só em outubro passado foram entregues 50 mil hectares em todo o território.
“A terra não é simplesmente para se ter, como pensavam os senhores feudais, não é um símbolo de poder, mas é um instrumento comum para construir, sobre os sulcos e com o suor humano, a reprodução da própria vida”, disse o Presidente Gustavo Petro durante evento em San Sebastión, Magdalena.
A entrega de terras às comunidades camponesas e indígenas é proposta na forma de devolução aos referidos territórios que são “inalienáveis e imprescritíveis” de acordo com a Reforma Constitucional de 1991, que também os reconhece como entidades territoriais.
Significa que a lei confere o caráter de entidade territorial às comunidades constituídas, com autonomia e direito de serem governadas por autoridades próprias, e com participação na renda nacional. Por outras palavras, o Estado nacional é obrigado a enviar rubricas orçamentais para estas entidades, bem como para os municípios ou províncias.
A Colômbia é fortemente afetada pelo seu processo de “paz”, que a sociedade apresenta como horizonte diante de tantos conflitos políticos e armados. “O novo governo acha que é hora de devolver a terra ao povo. Eles estão tentando construir o contexto colombiano e o contexto global”, afirma Anuka Da Silva, representante da A Via Campesina no Sri Lanka, para a ARG.
La Vía Campesina (LVC) possui uma propriedade de 16 hectares em Cundinamarca, a três horas de Bogotá, com 16 unidades produtivas entre pecuária e agricultura com lavouras de café, cana-de-açúcar, fruteiras, mandioca, batata e racacha. Os terrenos prontamente entregues pelo presidente Petro serão recebidos pelos jovens que atualmente estão se formando na Universidade Camponesa.
“Parece-nos que é necessário mais”, afirma Nury Martinez, representante da LVC na Colômbia. “Acreditamos que deve haver mudanças estruturais para uma verdadeira reforma agrária, como o fortalecimento das redes produtivas, de comercialização e de valor agregado”, sustenta.
Política Agrária é definida em nível global
“Quando falamos de Reforma Agrária, falamos também de desenvolvimento rural, porque estamos do outro lado do modelo de propriedade da terra para acumulação de capital, mas também do seu trabalho”, acrescenta Da Silva, que assegura que de África e Na Ásia também procuram novas reformas agrárias.
“Na Ásia também temos problemas com a terra porque as empresas, os proprietários e os herdeiros são proprietários das suas terras, mas como pessoas e agricultores não temos acesso à terra nas leis”, explica a agricultura.
Existem vários exemplos de reformas agrárias no mundo. No Sri Lanka começaram na década de 60 com a saída do Império Britânico. Mas em muitos sectores do país permaneceram inacabados. Na Indonésia e no Brasil também houve grandes movimentos. Em Cuba e no Zimbabué, as reformas agrárias também começaram durante a década de 1980.
“Temos experiência como movimento camponês internacional e acreditamos que esta reforma é necessária para construir a soberania alimentar”, afirma Anuka.
A Reforma Agrária que o Petro realizará limita-se a instrumentos jurídicos internacionais que estão acima das Constituições, como os Tratados de Livre Comércio – que estão acima da Lei 160, e o Acordo de Paz – e permitem a importação de alimentos, o que impede a impedir o campesinato de competir com produtos importados, como batatas da Irlanda ou bananas do Equador.
Ou o Acordo sobre Tarifas e Comércio (GATT) da Organização Mundial do Comércio (OMC) que não considera a alimentação um direito humano, mas sim uma mercadoria.
Desde 1995, toda a política agrícola comum está sujeita à disciplina da OMC. “Uma base jurídica a nível global que impossibilita o avanço da soberania alimentar e o reconhecimento da alimentação como um direito humano”, acrescenta Nury Martinez, e admite que “A Reforma será feita com o que a lei permite”.
“A política agrária é definida globalmente. São debates internacionais”, explica Martinez. É por isso que na COP16 sobre Biodiversidade, a Ministra da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Martha Carvajalino, anunciou algo histórico para a Colômbia; O país sediará a Segunda Conferência Internacional sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural +20 , a mais importante instância de diálogo que o movimento camponês mantém em todo o mundo.
A primeira e última conferência de Reforma Agrária foi em 2006 no Brasil; O debate era acabar com a fome, promover a agricultura sustentável, ter uma boa governação da terra e democracia para acessá-la. “O campesinato internacional não se reúne há 20 anos. O que aconteceu durante estas últimas duas décadas?”, pergunta Martinez.
Para a Conferência de 2026 que será na Colômbia, o campesinato internacional dispõe de novas ferramentas, como a declaração dos direitos dos camponeses. Além de incluir novos temas que se tornaram centrais na produção de alimentos nos últimos anos, como a agroecologia, o direito à terra e a participação de mulheres e jovens.
Não há Reforma sem agroecologia
Enquanto a Reforma Agrária é realizada na Colômbia, o campesinato avança nas estratégias de sustentabilidade das suas economias locais. “No momento em que as entregas de terras são feitas na Colômbia, o campesinato deve estar oferecendo uma grande diversidade na sua produção”, diz Martínez. “Só podemos conseguir isso com a agroecologia.”
Mas também com circuitos de comercialização eficientes para pequenas economias agrícolas. A Via Campesina trabalha nos mercados locais e na comercialização sem intermediários, além de agregar valor e uma forte revalorização da produção local.
A agroecologia na Colômbia é uma cultura ancestral com a qual cresceram muitos produtores, mas a partir da famosa revolução verde dos anos 90, as técnicas originais foram substituídas por agrotóxicos, embalagens tecnológicas e sementes transgênicas. “As fazendas por onde você passou, mesmo que pequenas, tinham monocultura”, diz Nury Martínez.
O pai de Martínez ensinou a ela e aos irmãos como produzir sem produtos químicos. “Quando íamos arrancar uma mandioca, tivemos que plantar duas”, lembra Nury. “Enquanto houver terra, ninguém poderá suportar a fome, disse meu pai.”
“Agroecologia é muito mais do que produzir sem produtos químicos. É um diálogo com a terra, com a sua gente e com o território”, afirma a agricultora. “Existem ecossistemas onde não pode ser produzido de outra forma que não a agroecológica”, afirma. Por exemplo, o paramo, ecossistema que produz 70% da água do país e que também chega à Venezuela, Bolívia e Equador. A Colômbia possui a maior charneca do mundo e suas árvores – frailejones – possuem altas propriedades medicinais.
Os mouros estiveram em perigo com o batalhão de alta montanha durante a era Uribe, um plano para perseguir os agricultores que viviam naquela zona com o objetivo de desmatar e acabar com os grupos de guerrilha de alta montanha. “As empresas querem esses territórios e nós não permitimos isso. É por isso que nós, agricultores, somos guardiões dos territórios”, afirma Martínez.
Aliança entre produtores e ambientalistas
O campesinato colombiano constitui 30% da população total do país e, embora seja um movimento forte , o pesquisador colombiano Oscar Forero considera que “a verdadeira luta está na articulação do movimento camponês-indígena com os ambientalistas”, uma das alianças mais importantes nos últimos anos e que permitiu, no caso desta COP16, a criação do órgão subsidiário 8J, órgão autônomo de revisão e cumprimento do artigo sobre recursos genéticos digitais da Convenção da Diversidade Biológico.
Hoje muitos dos alimentos vendidos nos supermercados são 100% fabricados em laboratórios. Faz parte da chamada “agricultura 4.0”, que consiste na digitalização de variedades e espécies, e na criação de alimentos em laboratórios. “Muitas das coisas que estão sendo levantadas hoje na COP já havíamos alertado, como a fabricação de alimentos em laboratórios e a tentativa de acabar com quem os produz”, alerta Nury Martínez.
O crescimento do consumo consciente nas sociedades e o maior interesse em saber de onde vêm os alimentos têm sido um dos slogans que têm aproximado movimentos camponeses, indígenas e produtores com consumidores ou ambientalistas.
Os exemplos de ambas as coligações são vários. Associações de consumidores em aliança com produtores estabeleceram Sistemas Participativos de Garantia (SPG) com os quais é certificada a qualidade da produção de alimentos agroecológicos de organizações de produtores que hoje não são reconhecidas pelos Estados com selos de qualidade.
“Um dos países mais avançados nesse sistema é o Brasil, onde as associações de consumidores têm participado do cronograma de plantio, em troca de gerar acordos com os produtores como a substituição de alimentos sazonais, porque há alimentos que não estarão disponíveis o tempo todo. ano”, explica Forero.
Fonte:
https://argmedios.com.ar/que-discute-hoy-el-campesinado-a-niel-mundial/
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