3 de fevereiro de 2023
Comunicação MPA
A história de vida de Camilo Torres certamente tem suas singularidades. Nascido em 3 de fevereiro de 1929, ele era filho de uma família de Bogotá bem ajustada. Seus pais, livres pensadores com inclinações anticlericais, se opuseram fortemente à sua entrada no Seminário Maior de Bogotá, mas a teimosia do jovem Camilo superou a oposição de seus pais e, em 1954, ele foi ordenado sacerdote. Nesse mesmo ano ele entrou na Universidade de Lovaina (Bélgica) para estudar Sociologia. Sua tese de doutorado foi intitulada A proletarização de Bogotá (1958).
Na Europa, ele conheceu o movimento dos Sacerdotes Operários na França e trabalhou com a resistência argelina em Paris. Ao retornar ao seu país natal em 1959, foi nomeado capelão da Universidade Nacional da Colômbia (Bogotá). Junto com seu amigo, o sociólogo colombiano Orlando Fals Borda, ele fundou a Faculdade de Sociologia e criou o primeiro programa disciplinar em Sociologia na América Latina. Ele também criou um movimento de alcance universitário com as comunidades marginalizadas do país, chamado Movimento Universitário de Promoção Comunal (MUNICIPROC).
Naquela época, Camilo já havia estado próximo da Juventude Comunista e do movimento estudantil participando de protestos, o que lhe valeu pena de prisão e a animosidade da hierarquia católica de Bogotá. Seu ativismo político e intelectual se tornou mais radical a cada passo que dava, o que não passava despercebido pelos que estavam no poder. Finalmente, o arcebispado de Bogotá ordenou a sua demissão de todas as suas atividades na Universidade Nacional.
A militância comunitária, por meio do MUNICIPROC, abriu seus olhos para a possibilidade de auto-organização e empoderamento das comunidades. Camilo começou a descobrir o potencial do que mais tarde seria chamado de “poder do povo”.
Em 1962, tendo renunciado a todas as suas atividades na Universidade Nacional, começou a trabalhar para o Instituto Colombiano de Reforma Agrária (INCORA). Pelo INCORA, ele viajou pela Colômbia rural e conheceu em primeira mão a realidade da opressão e exploração do campesinato colombiano. Ele também foi capaz de refletir sobre as razões estruturais da violência no campo.
Camilo foi um homem de seu tempo e a época em que viveu foi violentamente convulsionada pela disputa entre a revolução e a contrarrevolução.
Naquela período, a revolução cubana havia triunfado e se declarado uma Pátria Socialista aliada à URSS sob o nariz do imperialismo estadunidense que, raivoso e desenfreado em sua cruzada anticomunista mundial, já havia assassinado Patrice Lumumba no Congo, organizado o golpe de Estado no Brasil, enviado tropas ao Vietnã e invadido a República Dominicana.
Naturalmente, a viagem de Camilo durante esses anos lhe deu clareza política. Ele começou a compreender a absoluta incompatibilidade do capitalismo com os princípios cristãos. Baseado no “amor eficaz ao próximo”, ele, que antes era defensor e apologista da Igreja, agora a denunciava publicamente por “ter se prostituído para os poderosos”. Camilo tomou consciência de que a classe popular – trabalhadores, camponeses, indígenas, afro-colombianos, estudantes, mulheres – tinha que se unificar em meio à sua diversidade, e fazer política fora da institucionalidade burguesa estabelecida.
Naqueles anos, a Colômbia foi governada pelo Pacto da Frente Nacional, um acordo inter-oligárquico de alternância de poder entre Liberais e Conservadores, sem a possibilidade de participação de qualquer outra força política. A todos aqueles que não se sentiam representados por este pacto de poder, Camilo os batizou como “os não-alinhados” e os convocou a formar um movimento nacional de massa. Assim nasceu a Frente Unido do Povo (FUP), em 1965.
A plataforma da Frente Unido era nada menos que um programa revolucionário que só poderia se materializar com “a tomada do poder pelo povo”. Nesse mesmo ano, sob pressão da hierarquia eclesiástica e a fim de ganhar independência para assumir o árduo trabalho revolucionário, Camilo renunciou a seus compromissos clericais (não ao sacerdócio), anunciando-o em sua emblemática “Mensagem aos cristãos” (1965):
Deixei os privilégios e deveres do clero, mas não deixei de ser um padre. Acredito que me entreguei à Revolução por amor ao meu próximo. Deixei de rezar missa para perceber este amor pelo próximo, nas esferas temporal, econômica e social. Quando meu vizinho não tiver nada contra mim, quando eu tiver realizado a Revolução, voltarei para rezar a Missa, se Deus me permitir.
Estes foram tempos de militância política febril para Camilo. Ele viajou por todo o país, visitando bairros, vilas e cidades para organizar os Comitês da Frente Unido. Sua convicção sempre foi de construir a unidade popular de base, de baixo para cima, “sem diferenças partidárias religiosas ou tradicionalistas”. Conseguiu reunir diversas organizações e forças políticas – os “não-alinhados” -, incluindo o Partido Comunista da Colômbia. Seu carisma e sua oratória encheram as ruas. Estima-se que ele mobilizou mais de um milhão de pessoas em sua turnê pelo país.
Assediado e sitiado pelos aparatos de segurança e inteligência do Estado colombiano, com informações confiáveis de que estavam sendo organizadas formas para assassiná-lo, Camilo decidiu ir para a clandestinidade e viajar para as montanhas de Santander (nordeste da Colômbia), juntando-se à guerrilha do Exército de Libertação Nacional (ELN): uma organização político-militar guevarista fundada no calor da Revolução Cubana em 1964. Naquele momento, ele enviou uma proclamação ao povo colombiano:
Eu me juntei à luta armada. Desde as montanhas colombianas, pretendo continuar a luta com as armas na mão, até conquistar o poder para o povo. […]
Para a unidade da classe do povo, até a morte!
Para a organização da classe trabalhadora, até a morte!
Para a tomada do poder pela classe trabalhadora, até a morte!
Em 15 de fevereiro de 1966, Camilo Torres caiu em combate tentando recuperar um fuzil do exército inimigo no Pátio Cemento (Santander). O exército colombiano desapareceu com seu corpo e até hoje se recusou a entregar seus restos mortais na tentativa de evitar sua martirização, mas foi em vão: o mito de Camilo corre pela Colômbia e Nuestra América inspirando milhares de mulheres e homens de fé cristã a assumirem a luta revolucionária até as últimas consequências.
Isabel Restrepo, sua mãe, anos mais tarde, pronunciou profeticamente estas palavras: “Camilo nasceu no dia em que o mataram”.
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