8 de fevereiro de 2018
A liberdade de conservar, utilizar (plantar, colher, armazenar, reproduzir, ceder, e beneficia, trocar e vender) suas sementes é uma pratica cultural e comum aos agricultores há muitos séculos. E é também, um direito assegurado no artigo 9º do Tratado Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura – TIRFAA ao qual o Brasil é signatário, tendo sido promulgado pelo Decreto nº 6.476 de 05 de julho de 2008.
O Projeto de lei (826/2015) colocará em risco a soberania alimentar e genética dos agricultores, na prática, é inegável que acontece um impacto sobre o custo de produção afetando a renda do agricultor e acréscimo dos preços ao consumidor, criando, portanto, restrições de acesso aos alimentos indispensáveis a sadia qualidade de vida.
Quanto a preservação a Constituição Federal (Artigo, 225, II) ressalva que o meio é bem de uso comum e essencial a sadia qualidade de vida, sendo dever do Poder Público e da coletividade cuidar, proteger, preservar e garantir a diversidade e a integridade do patrimônio genético.
Mas a partir de então, e por pressão das grandes corporações internacionais do sistema agroalimentar industrial, foram criadas novas leis que deveriam garantir a preservação do patrimônio genético e a segurança alimentar, mas que estão promovendo a destruição da biodiversidade e impedindo que políticas públicas possam efetivamente promover e resguardar esse direito dos pequenos agricultores. Essas novas leis contribuem para a consolidação do monopólio das empresas sobre as sementes, como a lei de sementes e a lei de proteção de cultivares que confere propriedade intelectual sobre as sementes de variedades agrícolas industriais.
Após a finalização dos acordos da Rodada Uruguai do GATT (acordo sobre tarifas da OMC), em 1997 entra na pauta política a discussão sobre a propriedade intelectual sobre cultivares agrícolas, sendo sancionada uma lei de proteção de cultivares (lei, nº 9.456 de 25 de abril de 1997), onde é estabelecida a concessão de Certificado de Proteção. Assim, a cultivar é considerada um “bem móvel para todos os efeitos legais”. Ou seja: a semente de uma planta agrícola “melhorada” ou “modificada” é considerada um bem móvel de propriedade de uma empresa e o agricultor para plantar, terá que sempre comprar novas sementes.
Como se não fosse muito, e visando aumentar o controle sobre o patrimônio genético vegetal, a bancada ruralista no Congresso Nacional, quer aprovar o PL No. 827 de 2015, o Projeto de Lei de Proteção de Cultivares (de autoria do deputado ruralista Dilceu Sperafico (PP-PR), que visa alterar a lei de 1997, cujo o objetivo central em seu artigo 1º é “ampliar os direitos dos obtentores vegetais sobre o material de multiplicação da cultiva protegida”. Ou seja, trata-se, portanto, de aumentar o monopólio das empresas sobre as sementes das plantas e mudas.
Pode-se afirmar que o projeto de lei em tramitação visa aumentar o controle das empresas obtentoras de cultivares sobre a agrobiodiversidade. Sabe-se que as práticas de conservação e uso próprio de sementes, por meio do armazenamento, plantio nas safras seguintes, a livre distribuição e comercialização fazem parte do modo de fazer agricultura dos agricultores.
Pelos parâmetros estabelecidos na lei as novas variedades desenvolvidas em território nacional e assinalada como nova cultivar será cadastrada no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) pelos seus criadores para que garantam a conferencia da proteção aos direitos de propriedade intelectual sobre a cultivar.
O poder dos obtentores, se constrói como um jogo de apropriação privada da diversidade vegetal, ou seja, da agrobiodiversidade, assim legalmente a um processo de apropriação da diversidade existente no campo como forma atual de expansão do agronegócio no campo, e para além da apropriação por meio da empresa ela transforma em mercadoria a diversidade agrícola que é produto de uso comum dos agricultores.
Além disso fica condicionando a reprodução e comercialização de sementes protegidas pela lei de cultivares à autorização da empresa melhorista da cultivar e a cobrança sobre o produto final processado assim o agricultor terá que pagar duas vezes tanto no ato da compra como na venda. Pela proposta do projeto haveria uma percentagem destinada a fundo que será gerido pelas próprias empresas para investir na pesquisa.
Esse projeto de lei está lastreado pelos interesses das empresas transnacionais que controlam o mercado internacional da indústria de sementes e afetará diretamente o direito a preservação das sementes crioulas cultivadas por gerações ao longo da história, e práticas tradicionais herdadas do esforço de agricultores e comunidades que há muito tempo vêm resistindo à substituição de suas sementes.
A proposta em tramitação se vier ser aprovada visa aumentar número de cultivares protegidas pela lei, ou seja, aumentará o número de cultivares que não poderão ser plantadas e comercializadas livremente pelos agricultores.
As sementes são, e sempre foram um bem de uso comum dos agricultores, mas foram “roubadas” pelo governo, quando aceitou o texto da Convenção da Diversidade Biológica-CDB e do Tratado da FAO (TIRFAA) que se comprometeram a preservar/conservar a biodiversidade e a agrobiodiversidade e não o fazem.
É fundamental reforçar que as sementes pertencem aos agricultores é o direito conquistado ao longo da história, portanto as variedades e sementes já existiam, foram apenas modificadas para se adequar às máquinas e ao mercado – como mercadoria. Mas elas não são mercadoria. Elas são a forma de se produzir alimentos, e um direito dos agricultores, é algo sagrado para os e as agricultoras, se querem sancionar leis que sejam para reconhecer o direito dos agricultores e não colocarem na ilegalidade por produzirem livremente suas sementes crioulas.
Claudeilton Luiz – Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
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