AUTOR(A)
Michele CorreaAUTOR(A)
Michele Correa5 de março de 2021
Michele Correa
MPA | Pelotas (RS)
Liberdade somente para os partidários do governo, somente para os membros de um partido – por mais numerosos que sejam –, não é liberdade. Liberdade é sempre a liberdade de quem pensa de modo diferente. Não por fanatismo pela “justiça”, mas porque tudo quanto há de vivificante, salutar, purificador na liberdade política depende desse caráter essencial e deixa de ser eficaz quando a “liberdade” se torna privilégio. Rosa Luxemburgo, A Revolução Russa
Precisamos de Rosa…
Mas não de qualquer Rosa…
Precisamos de Rosa Luxemburgo…
Uma mulher em seu tempo…
Uma revolucionária em sua época…
Que ainda hoje nos provoca!
Rosa Luxemburgo não era em primeiro lugar uma teórica, mas, antes de mais nada, uma ativista de dois partidos socialistas, jornalista polêmica e oradora de língua afiada, educadora popular, internacionalista convicta – e, naturalmente, uma mulher do seu tempo.
Em um tempo sombrio, como o que vivemos, três pessoas, cujas imagens são mostradas por quase todo lado: a de uma judia polonesa, assassinada na Alemanha, a de um argentino que, em 1967, caiu nas garras de seus assassinos na Bolívia, assim como a de um italiano que, em 1937, depois de muitos anos de cárcere, foi libertado pelos fascistas para morrer: Rosa Luxemburgo, Ernesto Che Guevara e Antonio Gramsci, são luzeiros para iluminar pensamentos e desafiar reflexões.
Todos os três, mantiveram-se fiéis à unidade entre palavra e ação. Todos os três também se mantiveram fiéis ao pensamento independente, que não se submetia a nenhuma doutrina, a nenhum aparelho. E todos os três pagaram com a vida por suas convicções, tendo sido levados à morte não por adversários do próprio campo, mas pelos do campo inimigo, o que no século XX não era de forma alguma uma evidência.
A social-democrata e co-fundadora do Partido Comunista Alemão Rosa Luxemburgo foi poupada da ascensão de Stalin; em janeiro de 1919, foi espancada a coronhadas e por fim, como ainda vivia, levou um tiro. O social-democrata e cofundador do Partido Comunista Italiano Antonio Gramsci ficou encarcerado em sua terra natal de 1928 a 1934, quando, gravemente enfermo, foi libertado, vindo a falecer em 1937. Ernesto Che Guevara foi, por um breve período, uma liderança política no governo da Cuba revolucionária. Ainda hoje, Che Guevara dá asas à imaginação da juventude; Gramsci, há décadas, impressiona, sobretudo, os intelectuais; de Rosa Luxemburgo, no entanto, a mais complexa dos três, a maioria conhece apenas o nome e o destino, mas não o pensamento e a obra, e, na maioria das vezes, só como caricatura.
No pensamento e obra de Rosa, hoje o que me instiga a fazer sua memória são suas reflexões, ou melhor a sua concepção de partido. Assim, apresentarei aqui algumas considerações a partir das pesquisas de Isabel Loureiro (2004), autora de grande importância no estudo de Rosa Luxemburgo, a qual demonstra a tensão permanente do pensamento da autora polonesa. Loureiro explicita, a contradição entre o objetivo socialista do partido operário e a prática reformista da classe operária, o que a levou a uma teoria da e para a práxis. Esta contradição permanente no pensamento de Luxemburgo só pode ser entendida na relação histórico-crítica com o momento dos seus escritos e a finalidade política destes: seja combatendo a burocratização no SPD (Partido Social-democrata Alemão) ou nos sindicatos, seja combatendo o nacionalismo do PPS (Partido socialista polonês) ou ainda defendendo a democracia operária na Revolução Russa.
Uma das bases do pensamento de Luxemburgo é a “Luta de classes: o fazer-se do partido e da classe”. Para Rosa, o partido proletário é resultado da luta de classes entre a burguesia e o proletariado. Sendo no processo da luta de classes que se põe a necessidade da existência de um organismo político para o desenvolvimento do combate proletário, essa necessidade não se dá somente nos grandes acontecimentos da lutas de classes, como as revoluções, mas mesmo nas lutas de classe mais elementares, isto é, nas lutas mais imediatas, como as reivindicações salariais ou redução da jornada de trabalho.
O partido político para a marxista polonesa aparece como um dos fatores da luta de classe, dentre outros, sendo um fator importante que cumpre o papel de vanguarda e direção política do movimento de massas da social-democracia, necessário para a superação de um estado da luta de classes, colocando em questão o poder político estatal. Para concretizar este papel, segundo Luxemburgo, o partido político deve realizar três funções:
– Organizar a classe operária: o partido é necessário para organizar a classe nos organismos de resistência econômica ou política, de forma a buscar uma coesão para a classe na sua luta, superando sua fragmentação e dispersão;
– Esclarecer a classe operária: o partido político por sua própria posição na luta de classes é quem pode dar uma visão geral da luta de classes, isto é, desenvolver uma teoria e uma estratégia para a luta da mesma através da análise histórica e de sua tradução em um programa político. É o partido que consegue sintetizar a política necessária na relação entre as necessidades imediatas e as necessidades históricas da classe operária, mas é somente a classe que consegue transformá-la em ação;
– Instigar a luta da classe operária: o partido deve indicar e defender uma política socialista no movimento operário; deve levar o programa estabelecido através da sua análise da luta de classes, da história e da economia capitalista, para o seio da classe operária, impulsionando suas lutas; essa materialização é sempre uma relação dialética entre a ação de massas e do partido político, e não de um dos dois separadamente. Estas três funções definem em linhas gerais a concepção de Rosa Luxemburgo sobre o partido político.
O papel do partido não pode ser compreendido sem a compreensão da historicidade do antagonismo social, e suas funções não podem ser entendidas como formas separadas do processo de luta de classes: o tempo e a intensidade de cada uma das atividades varia de acordo com o desenrolar do processo histórico e da luta de classes.
A concepção de partido da marxista, que tentei apresentar aqui, de forma bastante breve, apesar de levantar diversos elementos importantes para uma teoria do partido operário, deixa-nos sem uma elaboração sistemática sobre as formas que o partido assume em cada momento histórico ou em um momento histórico, sobre a definição mais aprofundada das funções e atividades do partido operário, não é uma receita, não é uma fórmula pronta.
Os elementos da reflexão de Rosa Luxemburgo são importantes para uma análise dos partidos contemporâneos, de maneira a ajudar-nos a compreender os caminhos seguidos por diversos partidos social-democratas e comunistas no pós-guerra, sem esquecer-se de uma análise do movimento real da classe e da sociedade, e assim contribuir para novas reflexões sobre os processos históricos de organizações que atuaram e ainda atuam na realidade brasileira.
CORRÊA, Michele. Uma rosa para uma rosa… Cem anos de ausência… Cem anos de uma resistente presença. Disponível em:
SCHÜTRUMPF, Jörn. Rosa Luxemburgo ou o Preço da Liberdade. Disponível em: https://rosalux-ba.org/wp-content/uploads/2015/05/Rosa-Luxemburgo_versao-web.pdf
CÉSAR, Renato. Concepção de partido em Rosa Luxemburgo. Disponível em: https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/cemarx/article/download/10809/6071
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